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Que vença o melhor

Que vença o melhor

Hadassa Castro

5.0
Comentário(s)
271
Leituras
5
Capítulo

Eu estou acostumada a ter adrenalina correndo pelas minhas veias. Piloto carros velozes e não me lembro de sentir medo da velocidade, há quem diga que eu sou corajosa demais, que não tenho medo do perigo; gosto de pensar que eu amo demais o que eu faço para ter tempo de sentir medo. O maior desafio da minha vida tem sido o sonho que eu escolhi seguir, quando você começa a sonhar com uma carreira que é dominada por homens, você tem que preparar muito a sua mente para os obstáculos que terá que enfrentar. E bom, quando eu achei que entrar na Stock Car ia ser a realização da minha vida, eu não imaginei que teria que confrontar tantas pessoas que me julgavam ser incapaz de estar ali. Nunca me prepararam para o olhar que ele me daria, ao ver que eu estaria competindo lado a lado, nunca me alertaram sobre a maneira como ele me olharia com desdém e repulsa. Tristán tem sido o meu problema, desde o momento em que bateu os olhos em mim. O que ele não sabe, é que eu sou uma competidora a altura e jamais vou abaixar a minha cabeça para a sua arrogância. Alguém tem que ganhar, certo? Então que vença o melhor.

Capítulo 1 Prólogo

Eu sinto o pedal afundar abaixo do meu pé, enquanto coloco mais força sobre ele. Ainda não era o suficiente! Percebo o carro que nesse instante ocupa o primeiro lugar, me fechar. E isso automaticamente faz o meu sangue borbulhar. Meu reflexo é bom e eu consigo desviar bem a tempo, fazendo nossos carros ficarem lado a lado, eu vejo os seus olhos arregalados, por conta viseira do seu capacete aberta, no momento em que ele percebe o que eu acabo de fazer, sua cara se fecha e o meu sorriso presunçoso se abre.

Faço questão de abrir a minha viseira, dando uma piscada para ele, apertando o acelerador com mais força, o ultrapassando. Eu era a melhor por uma razão e jamais deixaria que um playboyzinho de merda se achasse melhor do que eu só por ser homem.

Dá próxima vez que alguém disser que ele dirige como uma mulherzinha, é bom que ele encare isso como um elogio, já que a mulher aqui, dirige muito melhor do que ele.

Consigo ouvir o ronco do motor do meu carro e sinto que nada mais importa, já posso avistar as bandeirinhas se aproximando. A linha de chegada está próxima, eu vou ganhar mais uma!

Um sorriso toma conta do meu rosto e eu sinto os meus olhos se encherem de lágrimas, me sentindo realizada por estar conseguindo ganhar mais uma.

Chupa essa, haters! Chupa essa, pessoas que não acreditaram no meu potencial e acharam que eu não chegaria a lugar algum nessa carreira, por ser mulher. Chupem essa!

Eu começo a gritar e quero jogar um dos meus braços para fora da janela do carro, para comemorar junto com as pessoas que estão assistindo a corrida, já que os gritos que elas soltam em meu favor são bastante barulhentos.

Eu sabia que tinha muita gente, principalmente as pessoas mais tradicionais, que não curtiam muito bem a ideia de uma mulher ganhar dos outros pilotos homens e sei que eu não sou a favorita da grande maioria, na verdade, a minha torcida é bem pequena. Mas sinto que quanto mais eu me esforço e mais corridas eu ganho, mais torcida eu ganho.

Eu vou ganhar o meu espaço, não importa que eu precise fazer um trabalho de formiguinha e conquistar isso lentamente. O importante é conquistar.

- Sophie, não comemore ainda! Você sabe como o Tristán é traiçoeiro, ele não vai aceitar essa ultrapassagem numa boa, com certeza tem alguma carta na manga. – Ouço o chefe da equipe gritando no meu ouvido.

Além de ser um arrogante desgraçado e se achar melhor do que todos ao seu redor, Tristán tinha uma fama terrível nas pistas. Ele era conhecido como o piloto mais traiçoeiro que podia existir, tudo porque os seus métodos eram extremamente arriscados. Com ele, o jogo tinha que ser até o final, e ele definitivamente não tinha medo de sujar as suas mãos para isso. Suas ultrapassagens sempre eram arriscadas e colocavam a vida dos outros pilotos em risco, tudo para ganhar. Esse era o lema dele.

E para ser sincera, eu não sei o quão ruim isso era. Quer dizer, eu sou extremamente competitiva, sempre fui. Mas eu jamais colocaria a vida de outras pessoas em risco, não quando existe outras maneiras de conseguir o resultado desejado. Eu não preciso puxar o tapete de ninguém para provar que sou boa, diferente dele.

Dou uma olhada no retrovisor e vejo o momento exato em que o carro atrás de mim encosta na minha traseira, é algo leve, mas que causa o estrago desejado por esse desgraçado. Tristán é um piloto experiente e ele estava ciente do caos que essa sua atitude poderia causar, mas mesmo assim ele faz. Esse homem é tão maldoso, que chega a embrulhar o meu estômago.

Tudo acontece em segundos, meu carro que está em alta velocidade começa a virar para a esquerda, sem que eu consiga fazê-lo parar, ou ajeitá-lo na pista novamente, e não demora para que eu perca o controle dele de uma vez. Seguro firme no volante e ouço o seu pneu fazer um barulho ensurdecedor, enquanto derrapa pelo chão na tentativa de frear. O carro vira demais e é o momento que eu entendo que ele vai capotar. Agarro o meu cinto, apenas para ter certeza de que eu estava presa e sinto um alívio por ver que sim.

Eu ainda não quero morrer, tenho muita coisa para viver.

Eu ouço a minha equipe gritando coisas desconexas no rádio, mas não consigo entender uma palavra sequer do que eles falam, talvez estejam chamando alguém para me socorrer antecipadamente. Fecho os meus olhos e apenas espero pelo pior. Eu já tinha sofrido acidentes antes, mas nunca tinha capotado o carro, então a situação me preocupa um pouco. O meu coração começa a disparar e eu peço baixinho para não morrer agora. Não realizei todos os meus sonhos ainda.

Sinto tudo ao meu redor girar algumas vezes, o que me deixa muito tonta e enjoada. O carro para bruscamente e eu solto um suspiro.

A única certeza que tenho antes de sentir minhas pálpebras pesarem é que o desgraçado ganhou e eu estou viva, pelo menos estava, até agora.

Sinto alguém puxando o meu cinto e meus olhos se abrem, vendo que era um paramédico e ele parecia brutalmente tenso com a situação, ele me solta e me leva até a maca que estava ao lado do meu carro. Eles já tinham colocado um colar cervical em mim, para que eu não sofresse mais nenhum dano no meu pescoço. E o capacete em minha cabeça, já tinha desaparecido. Indicando que eu apaguei por uns bons minutos.

Nenhuma parte do meu corpo dói, então eu sei que não devo ter tido nenhuma lesão mais grave, ou talvez seja só a minha adrenalina me escondendo o que eu sinto. A minha maca é colocada dentro da ambulância e o paramédico se senta ao meu lado, antes que ela comece a andar em alta velocidade.

Percebo que não consigo ficar com os olhos abertos o tempo todo, quase como se eu precisasse lutar para ficar acordada.

Só consigo pensar que a minha família em peso tinha vindo para assistir essa corrida e que nesse instante, eles devem estar surtando com o meu acidente.

Acho que não preciso dizer que eu virar piloto, não foi uma grande realização para os meus pais e meus irmãos. Todos sempre se preocuparam com o meu bem-estar e com o que podia me acontecer na pista, e sabe, não posso nem julgá-los. Eu sinto que só teria o apoio total deles, se já existisse alguém da família que fosse piloto.

Então agora vocês devem estar se perguntando de onde surgiu esse meu sonho.

Acho que foi da minha paixão pelos carros, eu sempre fui apaixonada por tudo que envolvia eles e me lembro da sensação de assistir a minha primeira corrida, na época foi de fórmula 1. Naquele dia eu soube que era aquilo que eu tinha que fazer, era a minha vocação e nenhuma outra profissão foi capaz de me ganhar dessa maneira.

Me lembro que tinha um lugar perto de casa, onde alguns meninos ficavam apostando corrida, usando um kart. Para usar o pequeno carro por alguns minutos, para correr na pista que eles tinham, era muito caro e minha família não tinha a condição financeira para pagar isso para mim. Não sei se as pessoas têm consciência disso, mas essa carreira é muito elitista. As pessoas precisam ter muito dinheiro para começarem a disputar no kart, para ganhar experiência pilotando e sempre começam muito cedo, porque é uma profissão que exige um certo planejamento. Mas eu, sendo pobre, não tive essa chance. Para começar no kart, eu precisei oferecer os meus serviços para o dono do local, em troca de algumas horas praticando, sempre de noite, em um horário que não tivesse clientes. Quando os meninos que frequentavam aquele lugar descobriram que eu estava praticando, as provocações começaram e eu tive que lidar com muitos comentários maldosos, como:

“Você acha mesmo que vai conseguir chegar a algum lugar? Você é mulher.”

“Seu sonho é pilotar profissionalmente? Acho melhor desistir, porque você não vai chegar a lugar algum.”

“Você nunca será boa o bastante para essa profissão, nunca vai conseguir entrar em uma equipe de verdade e fazer carreira.”

Esses foram só alguns dos comentários que eu tive que ouvir, com a intenção de me desmotivar, mas isso nunca fez o efeito necessário, ouvir aquelas coisas nunca me desanimou.

Na verdade, elas foram o meu combustível para persistir ainda mais no meu sonho, ouvir aquelas coisas só me fez entender do quanto eu era capaz, porque se eles realmente acreditassem no que estavam dizendo, não perderiam tempo jogando isso na minha cara. As pessoas só atacam quem elas julgam ser forte, quem elas acreditam ter potencial para desbancar elas.

No fundo, eles tinham pavor que eu, como mulher, fosse um piloto melhor do que eles.

- O que você está fazendo aqui? – o grito alto alcança os meus ouvidos e na mesma hora, meu corpo desperta. Pisco algumas vezes, encarando as paredes brancas que me cercavam, demorando alguns segundos para entender a onde eu estava, para me localizar.

Sou atingida pelas memórias do meu acidente, me dando conta de que eu estava no hospital, após o maldito do Tristán bater na traseira do meu carro.

Encaro o meu corpo, procurando por algum ferimento grave, mas aparentemente não tem nada. Eu tinha uma corrida muito importante daqui dois dias e se tivesse uma lesão séria, não poderia competir.

- Vim ver como ela está. – é a voz do Tristán e ele não estava falando tão alto, como a outra pessoa.

Tudo o que me separava deles, era uma cortina fechada, bastava abrir ela e eles me veriam.

É sério isso? É sério que esse imbecil veio aqui para me ver?

Sinto todos os meus músculos tremerem e o meu punho se fechando com uma certa força, na medida que os meus dentes trincam, tamanho é o meu ódio por esse garoto.

- Você só pode estar de brincadeira! Você causa o acidente dela e tem a cara de pau de vir até aqui? – a indignação no tom da voz do meu ficante/amigo, é palpável.

A minha relação com o Joseph é até que antiga, tudo começou com uma amizade e depois de um tempo, a gente achou que seria interessante avançar um nível e assim fizemos, mas como eu não tinha tempo algum de administrar uma relação mais séria, a gente deixou de uma maneira mais casual.

Ele me apoiava em tudo, até no meu ódio pelo Tristán, já que ele compartilhava do mesmo sentimento.

Não que dê para julgar algo assim, já que o Tristán é realmente um ser humano detestável, o tipo de pessoa que a maioria não gosta muito.

- Eu não causei o acidente dela, apenas fiz uma ultrapassagem, não tenho culpa se a sua namoradinha não conseguiu manter o controle do carro. – fala com um certo deboche e arrogância.

Eu consigo até visualizar a sua feição ao dizer isso e apenas essa ideia, faz o meu sangue borbulhar de raiva.

- Joseph, como ela está? – ouço uma voz desesperada e solto um suspiro, era a minha mãe.

- Não foi nada grave. – Joseph tranquiliza a minha mãe.

É questão de segundos para a cortina na minha frente se abrir, me dando a visão de todos os meus familiares, Joseph e o imbecil do Tristán.

Minha mãe anda até a maca onde eu estou deitada em passos rápidos e para ao meu lado, agarrando a minha mão direita.

- Minha filha, como você sofre um acidente daquele? Tem noção do susto que me deu? – as lágrimas surgem em seus olhos e ela pisca rapidamente, deixando algumas escaparem.

- Como você está? Se sente bem? – meu pai questiona, se aproximando da maca também.

- Eu estou bem.

- Não há razão para tanta preocupação, se eles trouxeram ela para esse ambulatório, é porque não foi nada grave. – a voz do Tristán surge no ambiente e eu faço uma careta de desgosto na mesma hora.

No nosso ramo acidentes graves poderiam acontecer o tempo todo, mas eles não eram os únicos. As vezes o acidente poderia parecer feio, mas só causava arranhões. Em caso de só arranhões, nós éramos trazidos até um pequeno ambulatório que ficava próximo as pistas, para atendimentos rápidos. Agora se fosse mais grave, teríamos que ser levados até o hospital mais próximo. No meu caso, não precisou. Graças aos céus!

Meus dois irmãos encaram o Tristán, de modo sincronizado, assim como o Joseph, e os olhares não são nada positivos. Ele por acaso tem noção do vespeiro onde acabou de enfiar a mão?

Eu sou a filha caçula, a única filha mulher.

Sou a protegida da minha família, então dizer algo desse tipo, ao lado dos meus irmãos, é pedir para levar uma surra.

- Espera, esse foi o desgraçado que bateu no carro da minha irmã? – Tadeu, o filho primogênito fala raivoso. Ele sempre foi o mais protetor comigo, então não seria uma grande surpresa se ele partisse para cima do Tristán.

3, 2, 1...

Basta o Joseph concordar com a cabeça, dando a resposta da pergunta que o meu irmão tinha feito, e pronto, Tadeu está agarrado no Tristán, com a camisa branca agarrada entre seus dedos, encarando o piloto com muita raiva. Meu irmão tinha um corpo absurdamente grande, apesar de nunca ter pego um peso na academia, mas o sítio da família lhe dava trabalho o bastante, para manter o seu corpo bem atlético.

Mas mesmo com o tamanho do meu irmão, Tristán não se intimida, ele apenas abre um sorriso de lado e segura a mão do meu irmão, tentando afastá-la da sua camisa, mas sem muito sucesso.

- O que você está fazendo aqui? Você podia ter matado a Sophie! – fala raivoso, aproximando o seu rosto do rosto do Tristán.

Bernardo, a calma e a sensatez da nossa família, se aproxima do Tadeu, apoiando uma de suas mãos no ombro do nosso irmão mais velho.

- Irmão, deixa disso! Você sabe que esse cara é um babaca. – fala com toda a calma e Tristán ri da sua ofensa, como o bom babaca que ele é.

Não posso negar que o Tristán é muito corajoso de vir até aqui, depois de tudo. Ele causou um acidente de propósito e ainda tem a pachorra de vir até aqui, para ver o resultado que o seu trabalho teve.

Como não detestar esse homem? Ele praticamente implora para ser odiado, a cada atitude que toma.

Céus, como ele consegue viver assim?

- Vamos, Tadeu. Solte ele de uma vez! – Bernardo fala de modo mais sério e o nosso irmão atende ao seu pedido, soltando o Tristán com uma certa agressividade, se afastando dele.

- Mas não pense que eu esqueci o que eu vi naquela pista hoje. – Bernardo fala sério, encarando o Tristán com uma certa raiva, enquanto aponta o dedo indicador na cara dele.

Bernardo era o irmão do meio, consequentemente era o mais calmo de nós três, geralmente ele apaziguava as brigas.

- Nossa, como vocês são estressados! – Tristán diz, com um sorriso no rosto, parecendo pouco se importar com a raiva mútua que está causando no ambiente.

Tenho a sensação que o Tristán não se importa com nada além dele mesmo e isso é bem preocupante, porque uma pessoa assim, é capaz de fazer qualquer coisa contra os outros. Sem pudor.

Abro a minha boca e estou prestes a xinga-lo de todos os palavrões existentes em meu vocabulário e olha que são muitos, já que eu falo cinco línguas. Mas o chefe da minha equipe surge antes que eu possa dizer qualquer coisa.

- Sophie precisa descansar, a enfermeira pediu para que todos vocês se retirem. – ele fala apressado, intercalando os seus olhos por todos os presentes.

Eu sinto um grande alívio ao ouvir ele dizer isso, porque estava começando a ficar perturbada com toda essa discussão ao meu redor, minha cabeça está começando a doer.

Eu acabei de sofrer um acidente e mesmo que ele tenha sido pequeno, eu não deveria estar presenciando uma briga generalizada.

Meus pais se despedem de mim e saem do meu quarto em passos rápidos, seguidos dos meus irmãos, que fazem questão de deixarem um beijo na minha testa, antes de irem. Joseph sai também, encarando o Tristán com a pior das suas feições. Que por sua vez, nem se mexe para sair do meu quarto. Isso só pode ser divida de jogo, o que esse homem ainda quer aqui?

- Todo mundo incluí você, então some. – falo para o Tristán, mostrando toda a aversão que a sua presença me causa.

- Na verdade, é bom que ele fique. – Joaquim, o chefe da minha equipe diz.

Encaro ele com indignação pura e o Tristán parece animado demais com a situação, talvez por ver eu sendo contrariada.

- Eu fui procurado por um representante de uma equipe muito importante, ele fez algumas perguntas para mim em relação a você. – Joaquim falou, olhando diretamente para mim.

– E depois eu vi ele fazendo o mesmo com o chefe da sua equipe. – olha para o Tristán. – Eu acho que eles estão sondando para chamar vocês dois para a equipe.

- Nós dois? – eu e o Tristán perguntamos juntos, com a mesma indignação.

- Você está querendo dizer que nós dois podemos trabalhar na mesma equipe? – pergunto em choque.

- Sim, é isso que estou dizendo. Vim avisar vocês para que ficassem cientes já, de que existe essa possibilidade.

Isso só pode ser brincadeira!

Eu e Tristán trocamos um olhar raivoso e descontente. Porque se tinha uma coisa, que ambos concordavam, é que trabalhar juntos era algo inviável para nós dois.

A gente se odeia e isso jamais daria certo.

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