Adaline Steiner nunca teve muita sorte na vida, cresceu em um lar violento e sem amor dos pais, na verdade ela sequer sabia quem era seu pai, eram apenas ela e sua mãe, que jamais demonstrou interesse em exercer esse papel na vida da filha que sempre precisou lutar para alcançar o que almejava. Jasper Hoffmann já não poderia dizer a mesma coisa em todos os quesitos, tinha crescido em berço de ouro e cercado do carinho de sua mãe, embora o pai não fosse suficientemente presente, sempre teve tudo que desejava e aos 21 anos já estava formado e assumindo as responsabilidades de um homem adulto. Por alguma razão do destino o caminho dos dois se cruzaram e não demorou para que o casamento ocorresse, mas não por desejo mútuo, mas por determinação de Theodore Hoffmann, a última coisa que desejava era um escândalo de devassidão e luxúria para o nome dos Hoffmann's que sempre tiveram sua imagem intacta e límpida como água cristalina, então, antes o filho tomasse gosto pela vida boêmia que o dinheiro e o poder poderiam lhe ofertar, ele tratou de firmar a união do casal que havia se mostrado em público apenas uma vez. Adaline poderia afirmar que tinha os sentimentos mais puros e sinceros por Jasper, mas ele não poderia assumir o mesmo, ele queria apenas diversão e a liberdade que o dinheiro lhe traria, e o único bônus que conseguiu com o casamento foi a imagem de responsável o bastante para assumir a cadeira de diretor geral da empresa da família aos 28 anos. Para ele a esposa era um empecilho com o qual ele não sabia lidar, para ela o casamento fracassado era apenas mais um dos fardos que estava destinada a carregar.
Capítulo 1 One More Night
As íris azuis de Adaline relutavam em despertar, mas o feixe de luz da persiana mal fechada da noite passada lhe forçava a sair do sono para se levantar e se livrar daquele maldito incômodo às 6h (seis) da manhã. Não demorou para que se deslizasse para fora dos lençóis da cama King Size que havia dividido com a própria solidão na noite anterior. Finalmente havia fechado as cortinas e poderia voltar para a cama, mas olhar para o espaço vazio ao seu lado lhe fez suspirar enquanto fechava os olhos e balançava a cabeça negativamente ao constatar o óbvio: Jasper não dormiu em casa.
Ainda eram 6:37h (seis e trinta e sete) da manhã, mas ela não conseguia voltar ao sono, mil e uma coisas se passavam em sua cabeça enquanto pensava em quantas noites o marido havia dormido fora nos últimos dezoito meses de casamento e concluiu que era mais fácil contar nos dedos os dias em que ele havia dormido em casa, ainda se lhe faltassem dedos seria possível contar sem dificuldades quantas noites foram essas. De qualquer forma era inútil ficar ali lastimando mais um fracasso em sua vida. Assim, ela se levantou e tomou uma ducha fria como de costume - apesar do clima frio de Newcastle naquela época do ano - para lhe fazer despertar dos seus pensamentos e iniciar a sua rotina monótona e nada interessante.
[...]
Já passava da 7:50h (sete e cinquenta) quando o motor do carro de Jasper rompeu o silêncio na garagem. Isso queria dizer que ele só teria pouco mais de trinta minutos para tomar banho, comer o café da manhã, se arrumar e chegar ao trabalho.
- Sem perguntas... - ele disse de forma ríspida ao cruzar a porta da sala de jantar e tomar o seu lugar diante da bela mesa posta de café da manhã que Marie havia preparado como em todas as manhãs.
Havia acabado de chegar em casa e já cuspia seu péssimo humor aos quatro ventos para deixar claro que não queria ser incomodado, embora ninguém houvesse lhe dirigido a palavra. Ainda...
- Não preciso de perguntas para saber onde estava. - Adaline disse de maneira serena sem lhe dirigir o olhar.
- Será que pode calar a maldita boca e respeitar a porra do momento do meu café da manhã? - Suas mãos se arrastaram pelas têmporas e se uniram na frente de seu pescoço ao finalizarem de alisar a barba por fazer.
Embora não passasse de um grande filho da mãe extremamente rude e arrogante, era inegável a beleza bem distribuída em seus 1,92m combinados com um par de olhos castanhos e cabelo no mesmo tom, a pele ainda bronzeada pelos dias quentes que havia tirado de férias nas praias do Caribe e os lábios médios com o tom levemente rosados lhe caiam perfeitamente com o cabelo bem cortado e a barba por fazer que apesar de nada harmônicos garantiam o visual perfeito para deixar Adaline levemente tonta apenas por olhar para aquele pedaço de pecado. E justamente por saber disso, ela não tirou os olhos do prato de salada de frutas servido por Marie.
- Me admira você saber o significado da palavra "respeito", nunca o vi praticar nos últimos dezoito meses. - a loura disse antes de levar um morango até o interior de seus lábios.
- Eu já te mandei calar essa maldita boca, precisa de ajuda para se lembrar como manter essa droga fechada? - suas palavras saíram como um rosnado de um cão prestes a avançar para defender sua caça do predador adversário.
- Não é culpa minha se o seu encontro da noite anterior não te satisfez o bastante para te fazer voltar para casa de bom humor. Mas se te serve de conselho, embora eu não me importe nem um pouquinho com as consequências disso pra você, guarde esse seu rosnado animalesco para responder ao seu pai quando ele te perguntar o motivo que o fez deixar esperando feito imbecis ele e o potencial investidor de Washington que voou por quase oito horas até aqui para avaliar a proposta de rendimentos elaborada por você mesmo. - Ela não elevou a voz, não demonstrou emoções ou sequer o olhou, sua vez permanecia serena e nenhum pouco preocupada com a ameaça de Jasper.
Adaline se levantou da mesa, limpou a boca com o guardanapo e o deixou ao lado do prato. Fez um gesto de agradecimento para Marie e deixou a mesa em seguida, mas ainda teve tempo de ouvir o bufar de Jasper ao se dar conta do erro que havia cometido na noite anterior, os dois sabiam muito bem que a essa altura Theodore Hoffmann deveria estar fazendo uma bela oferta para quem entregasse primeiro a cabeça de seu herdeiro em uma bandeja de prata decorada com ervas finas.
[...]
- O que disse a ele quando perguntou por mim? - Jasper perguntou sem tirar os olhos da estrada.
- Eu não precisei dizer nada Jasper, seu pai o conhece o suficiente para saber as respostas óbvias para esse tipo de pergunta. - disse organizando algumas folhas na pasta em seu colo.
- E você sequer tentou argumentar a meu favor, não é mesmo? - questionou com sarcasmo.
- Fiz por você o mesmo que você faria por mim... Nada. - sua voz saiu como um sussurro decepcionado. Nada. Era exatamente isso que Jasper faria para protegê-la ou que faria a seu favor. Absolutamente nada.
Nos instantes seguintes o silêncio tomou conta do interior do veículo, nada que os dois não estivessem familiarizados. No início, eles até trocavam palavras, faziam piadas de escárnio da própria situação, mas com os meses que se seguiram aos dois primeiros do casamento, nada disso existia mais. Entretanto os dois trabalhavam juntos, Adaline não havia aberto mão da carreira mesmo depois do casamento, então iam juntos quase todas as manhãs, embora ela sempre precisasse chamar o motorista na hora da volta.
Quando Jasper parou o carro no estacionamento um suspiro pesado se esvaiu e logo ele soltou o cinto de segurança e deixou o veículo. Sequer ajudou a esposa a deixar o automóvel, apenas a esperou sair para ativar o alarme e se dirigir a passos largos para o interior do enorme prédio espelhado. Nem os acenos ou cumprimentos foram respondidos por ele, a única coisa que pensava era o humor que estaria Theodore a essa hora depois do compromisso perdido da noite passada. Bom, não demoraria muito para descobrir, agora ele já estava diante da porta do escritório de seu pai e bastou apenas um suspiro pesado para que tomasse coragem e girasse a maçaneta da enorme porta no final do corredor ao chegar no último andar do edifício.
- Sr. Hoffmann...