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A viajante do tempo - Diana Gabaldon

A viajante do tempo - Diana Gabaldon

Autor: Sther_V
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Capítulo 1 Recomeço

Palavras: 7762    |    Lançado em: 29/05/2023

erras Altas, a região montanhosa da Escócia, em 1945 – limpa e tranquila, com papel de parede oral desbotado, assoalhos reluzentes e um aquecedor de água operado com moedas no banheiro. A sra. Baird

esse experimentar esse tipo da próxima vez. Não tive coragem de lhe dizer que a rebeldia dos meus cachos castanho- claros era obra exclusiva da natureza e não devida a qualquer negligência por parte dos fabricantes de permanente. Suas próprias ondas rmemente marcadas não sofriam de tal perversidade. - Sim, farei isso, sra. Baird - menti. - Só estou indo à vila me encontrar com Frank. V

e férias antes de Frank assumir o cargo de professor de história em Oxford, considerando que a Escócia de certa forma fora menos atingida pelos horrores físicos da guerra do que o resto da Grã-Bretanha e estava menos suscetível à frenética alegria pós- guerra que contagiava pontos turísticos mais populares. Mesmo sem discutir o assunto, acho que nós dois sentimos que era um local simbólico para restabelecermos nosso casamento. Nós nos casamos e passamos uma lua de mel de dois dias nas Terras Altas, pouco antes da deagração da guerra sete anos atrás. Um refúgio tranquilo onde pudéssemos redescobrir um ao outro, pensamos, sem perceber que, enquanto o golfe e a pesca são os esportes ao ar livre mais praticados da Escócia, a fofoca é

ente ocial em meados dos anos 30, isto é, em meados de 1730, e serviu como capitão dos dragões. Segundo aquelas cartas antigas que a prima May me enviou, ele se saiu muito bem no exército. Uma boa escolha para um segundo lho, como você sabe. Seu irmão mais novo também seguiu a tradição tornando-se um vigário, mas ainda não encontrei muita coisa sobre ele. De qualquer modo, Jack Randall foi altamente elogiado pelo duque de Sandringham por suas atividades antes e durante a Conspiração Jacobita de 1745, a segunda, como você sabe - detalhou ele, em proveito dos ignorantes em sua plateia. Ou seja, eu. - Com o príncipe Charles Edward e toda aquela gente. - Não estou totalmente certa de que os escoceses achem que perderam essa - interrompi, sentando-me e tentando domesticar meus cabelos. - Ouvi perfeitamente o barman daquele pub ontem à noite se referir a nós como Sassenachs. - Bem, por que não? - disse Frank tranquilamente. - Anal, signica apenas "ingleses" ou, na pior das hipóteses, "forasteiros", e é o que nós somos. - Sei o que signica. Foi o tom que ele usou que me incomodou. Frank procurou um cinto na gaveta da cômoda. - Ele só estava zangado porque eu disse que a cerveja estava aguada. Eu disse a ele que a verdadeira cerveja das Terras Altas exige que uma botina velha seja acrescentada ao tonel e que o produto nal seja coado por uma cueca usada. - Ah, isso explica o total da conta. - Bem, eu disse isso com um pouco mais de tato, mas só porque a língua gaélica não possui uma palavra especíca para ceroulas. Peguei as minhas próprias calcinhas, intrigada. - Por que não? Os antigos celtas da Escócia não usavam roupa de baixo? Frank lançou-me um olhar malicioso. - Nunca ouviu aquela velha canção sobre o que o escocês usa por baixo do kilt? - Provavelmente não aqueles elegantes calções até os joelhos - respondi secamente. - Talvez, enquanto você ca brincando por aí com vigários, eu saia em busca de algum habitante local usando saiote escocês e pergunte a ele. - Bem, tente não ser presa, Claire. O reitor do St. Giles College não iria gostar nada disso. Na realidade, não havia ninguém perambulando de kilt pela praça central ou pelas lojas que a rodeavam. No entanto, havia várias outras pessoas por lá, a maioria donas de casa do tipo da sra. Baird fazendo as compras diárias. Eram tagarelas e fofoqueiras, e suas guras, de vestido estampado, enchiam as lojas de um calor aconchegante; um antídoto contra a névoa fria da manhã no lado de fora. Ainda sem minha própria casa para manter, havia pouca coisa que eu precisava comprar, mas gostava de dar uma olhada nas prateleiras recém- abastecidas pelo simples prazer de ver muitos artigos novamente à venda. Fora um longo período de racionamento, de privação de coisas simples como sabão e ovos, e mais tempo ainda sem os pequenos luxos da vida, como a água de colônia L'Heure Bleu. Meus olhos se demoraram numa vitrine repleta de utensílios domésticos - toalhas de chá e paninhos bordados para cobrir bules,

m bom humor. - Mas eu não sabia que teria galhinhos e folhas caindo no meu colo toda vez que abrisse uma obra de referência. O que era aquela coisa horrível, marrom e esfarelada, que você colocou no meu livro de Tuscum e Banks? - Sabugueiro. Boa para hemorroidas. - Preparando-se para a minha iminente velhice, não é? Hum, muito gentil de sua parte, Claire. Atravessamos o portão juntos, rindo, e Frank parou para que eu subisse os estreitos

os acompanhava a passos rápidos. - Mais velho do que podemos imaginar, sr. Randall. Anterior à época dos gigantes. - Gigantes? - perguntei. - Sim. Fionn e Feinn. - Contos folclóricos gaélicos - observou Frank com interesse. - Heróis, sabe. Provavelmente de origem nórdica. Há muita inuência nórdica por aqui e ao longo de toda a costa oeste. Alguns nomes dos locais são escandinavos, e não gaélicos. Revirei os olhos, pressentindo uma nova explosão de conhecimento, mas a sra. Baird sorriu cordialmente e encorajou-o, dizendo que era verdade, ela havia estado no norte e visto a pedra Dois Irmãos e isso era escandinavo, não era? - Os escandinavos visitaram a costa centenas de vezes entre 500 e 1300 d.C., aproximadamente - disse Frank, olhando sonhadoramente para o horizonte, vendo barcos normandos na nuvem varrida pelo vento. - Vikings. E trouxeram muitos de seus mitos com eles. É um bom país para mitos. As coisas parecem criar raízes aqui. Nisso eu podia acreditar. O crepúsculo se aproximava, assim como uma tempestade. Na estranha luz sob as nuvens, até as casas totalmente modernas ao longo da rua pareciam tão antigas e sinistras quanto a desgastada pedra do povo picto que cava a uns 30 metros de distância, guardando a encruzilhada havia mil anos. Parecia uma boa noite para car em casa com as persianas fechadas. Em vez de permanecer confortavelmente sentada na sala de visitas da sra. Baird, vendo imagens estereoscópicas de Perth Harbor, entretanto, Frank preferiu comparecer ao seu compromisso com o sr. Bainbridge, um tabelião com interesse em registros históricos locais, para tomar um xerez. Lembrando-me do encontro anterior que tivera com o sr. Bainbridge, resolvi permanecer em casa com Perth Harbor. - Procure voltar antes da tempestade - disse a Frank, dando-lhe um beijo de despedida. - E dê lembranças minhas ao sr. Bainbridge. - Humm, sim. Sim, claro. - Cuidadosamente evitando meus olhos, Frank encolheu os ombros dentro do seu sobretudo e partiu, pegando um guarda-chuva do suporte junto à porta. Fechei a porta quando ele saiu, mas deixei-a destrancada para que ele pudesse entrar ao voltar. Dirigi-me languidamente de volta à sala de visitas, reetindo que Frank iria sem dúvida ngir que não tinha mulher - uma farsa à qual o sr. Bainbridge iria se unir alegremente. Não que eu, particularmente, pudesse culpá-lo. No começo, tudo correra muito bem em nossa visita à casa do sr. Bainbridge na tarde do dia anterior. Eu me mostrara recatada, bem-educada, inteligente, mas modesta, elegante e discretamente vestida - tudo que a mulher perfeita do professor universitário deveria ser. Até o chá ser servido. Agora, virei a minha mão direita, examinando, com tristeza, a grande bolha que se estendia pela base dos quatro dedos. Anal, não era culpa minha que o sr. Bainbridge, um viúvo, se contentasse com um bule barato de metal, em vez de um bule adequado de louça. Nem que o tabelião, procurando ser gentil, tivesse me pedido para servir o chá. Nem que a luva de panela que ele me deu apresentasse uma parte gasta que permitiu que o cabo em brasa do bule entrasse em contato direto com minha mão quando o segurei. Não, concluí. Deixar cair o bule foi uma reação perfeitamente normal. Deixá-lo cair no colo do sr. Bainbridge foi apenas um infeliz acidente. Tinha que deixá-lo cair em algum lugar. Foi minha exclamação "Puta que pariu!" em voz mais alta do que o berro de dor do sr. Bainbridge que fez Frank me olhar enfurecido por cima dos pãezinhos. Quando se recuperou do choque, o sr. Bainbridge mostrou-se muito gentil, examinando minha mão e ignorando as tentativas de Frank de se desculpar pelo meu linguajar, alegando que eu servira em um hospital de campanha por quase dois anos. - Receio que minha mulher acabou pegando algumas, hum, expressões mais pitorescas dos ianques e de outros - sugeriu Frank com um sorriso nervoso. - É verdade - concordei, cerrando os dentes enquanto envolvia minha mão com um guardanapo embebido em água. - Os homens tendem a ser muito "pitorescos" quando se está tirando estilhaços do corpo deles. Com muito tato, o sr. Bainbridge tentou desviar a conversa para o campo neutro da história dizendo que sempre se interessara pelas variações do que fora considerado discurso profano através dos tempos. Havia "Gorblimey", por exemplo, uma corruptela recente da imprecação "God blind me". - Sim, é claro - disse Frank, aceitando de bom grado o desvio da conversa. - Sem açúcar, obrigado, Claire. E quanto a "Gadzooks"? A parte "Gad" é perfeitamente clara, naturalmente vem de "God", mas "zook"... - Bem, sabe - interpôs o tabelião -, às vezes eu acho que possa ser uma corruptela de uma antiga palavra escocesa, na verdade, "yeuk". Signica "tentação, ânsia, desejo". Faria sentido, não? Frank concordou, assentindo e deixando seu pouco erudito topete cair na testa. Empurrou-o para trás automaticamente. - Interessante - disse -, toda a evolução da blasfêmia. - Sim, e continua a acontecer - disse, pegando cuidadosamente um torrão de açúcar com a pinça. - É mesmo? - disse o sr. Bainbridge. - A senhora encontrou algumas variações importantes durante a sua, hum, experiência na guerra? - Ah, sim - respondi. - A minha favorita eu aprendi com um ianque. Um homem chamado Williamson, de Nova York, acho. Ele a dizia toda vez que eu trocava seu curativo. - E qual era? - "Jesus H. Roosevelt Cristo" - disse, deixando o torrão de açúcar cair cuidadosamente no café de Frank. Depois de passar algum tempo na sala com a sra. Baird, numa conversa amena e nada desagradável, subi ao meu quarto para me aprontar antes de Frank chegar. Sabia que o limite dele era de duas taças de xerez e, portanto, esperava-o de volta logo. O vento começava a soprar forte e o ar do quarto estava carregado de eletricidade. Passei a escova nos cabelos, fazendo os cachos estalarem com a estática e saltarem, emaranhando-se furiosamente. Meus cabelos teriam que passar sem as cem escovadelas hoje à noite, decidi. Com as atuais condições do tempo, iria apenas escovar os dentes. Fios de cabelo grudavam no meu rosto, agarrando-se teimosamente enquanto eu tentava afastá-los para trás. Nenhuma água no jarro. Frank a usara, arrumando-se antes de sair para seu encontro com o sr. Bainbridge, e não se dera ao trabalho de enchê-lo novamente na torneira do banheiro. Peguei o frasco de L'Heure Bleu e despejei uma boa porção na palma da mão. Esfregando rapidamente as mãos antes que o perfume evaporasse, passei-as pelos cabelos. Despejei mais um pouco na escova e penteei os cachos para trás das orelhas. Bem. Assim estava melhor, pensei, girando a cabeça de um lado para o outro para examinar os resultados no espelho manchado. A umidade dissipara a eletricidade dos meus cabelos, de modo que eles agora utuavam em ondas brilhantes e pesadas em volta do meu rosto. O álcool evaporado deixara um perfume muito agradável no ar. Frank iria gostar, pensei. L'Heure Bleu era sua colônia favorita. De repente o clarão de um relâmpago bem próximo, seguido imediatamente pelo estrondo de um trovão, fez com que todas as luzes se apagassem. Praguejando baixinho, comecei a tatear dentro das gavetas. Em algum lugar, eu vira velas e fósforos; a queda de energia elétrica era uma ocorrência tão frequente nas Terras Altas que as velas constituíam um suprimento indispensável em todos os quartos de hotéis e hospedarias. Eu as vira até mesmo nos hotéis mais elegantes, onde eram perfumadas com madressilvas e apresentadas em castiçais de vidro fosco com pingentes brilhantes. As velas da sra. Baird eram bem mais utilitárias - velas brancas comuns -, mas havia muitas delas, assim como três caixas de fósforos. Não estava inclinada a ser exigente quanto à elegância num momento como aquele. Coloquei uma vela no suporte de cerâmica azul sobre a penteadeira iluminada pelo relâmpago seguinte, depois acendi outras pelo quarto, até que todo o aposento fosse tomado por uma luminosidade suave e bruxuleante. Muito romântico, pensei, e com certa presença de espírito desliguei o interruptor, de modo que a volta repentina da luz não estragasse o clima em algum momento inoportuno. As velas não haviam queimado mais do que um centímetro quando a porta se abriu e Frank entrou como um furacão. Literalmente, porque a rajada de vento que o seguiu escada acima apagou três velas. A porta se fechou atrás dele com uma pancada que apagou mais duas. Esforçando-se para enxergar na escuridão repentina, passou a mão pelos cabelos desalinhados. Levantei-me e reacendi as velas, admoestando-o brandamente sobre os modos bruscos de entrar num aposento. Foi somente ao terminar e me virar para perguntar-lhe se gostaria de um drinque que vi que ele parecia um pouco pálido e perturbado. - O que foi? - perguntei. - Viu um fantasma? - Bem, sabe - disse ele devagar -, não tenho certeza se não vi. - Distraidamente, ele pegou minha escova e ergueu-a para arrumar seus cabelos. Quando a fragrância repentina de L'Heure Bleu atingiu suas narinas, franziu o nariz e colocou-a de volta sobre a penteadeira, voltando a atenção para o pente que carregava no bolso. Olhei pela janela, onde os olmos se agitavam de um lado para outro como manguais. Uma persiana aberta batia em algum lugar do outro lado da casa e ocorreu-me que talvez devêssemos fechar as nossas, embora o alvoroço lá fora fosse interessante de observar. - Acho que o tempo está um pouco ruim para um fantasma - falei. - Eles não gostam de noites calmas e enevoadas em cemitérios? Frank riu timidamente. - Bem, provavelmente foram apenas as histórias de Bainbridge e um pouco de xerez a mais do que eu deveria ter tomado. Nada de mais. Agora eu estava curiosa. - O que você viu exatamente? - perguntei, sentando-me no banquinho da penteadeira. Indiquei a garrafa de uísque erguendo uma das sobrancelhas e Frank imediatamente foi servir dois drinques. - Bem, na verdade, apenas um homem - começou ele, medindo uma dose para ele e duas para mim. - Parado na rua lá fora. - O quê? Do lado de fora desta casa? - perguntei com uma risada. - Então deve ter sido um fantasma; não posso imaginar ninguém parado por aí numa noite como essa. Frank inclinou o jarro de água sobre o copo, depois olhou acusadoramente para mim quando não saiu nada. - Não olhe para mim - disse. - Você usou toda a água. Mas eu prer

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