"Deus não se esquece dos seus filhos." Após uma vida completamente perturbada, Justin acaba encontrando Estela, a garota que Deus usou para transformar sua vida.
Estela Wilson
Jorge's Grill
Quinta-feira
06:00PM
Quando o relógio da lanchonete soou marcando seis horas da noite, eu só soube pegar o meu pequeno bloco de notas que por sinal era onde eu anotava a maioria dos pedidos dos clientes. Ele era bastante útil nos meus momentos de correria pelo salão. Corri até o armário onde estava minha bolsa e o guardei. O dia tinha sido bastante agitado, nisso se resultaria em pernas para o alto por algumas horas. Não houve reclamações sobre os pedidos o que deixou não só eu, mas também o Jorge feliz. Ninguém gosta de ouvir reclamações de algo que deveria ser entregue perfeitamente bom e gostoso. Fiquei aliviada quando vi que tudo estava em seu devido lugar, chega a ser prazeroso esses pequenos momentos.
Jorge, o dono, chefe e garçom nas horas vagas, já estava me esperando do lado de fora do estabelecimento prestes a fechar a porta. As chaves estavam em sua mão, e só faltava desligar todas as luzes que havia encima de cada mesa. Passei por ele e suspirei fundo quando vi que teria o final de semana de folga.
Eu havia praticamente implorado por essa folga alguns dias atrás, e como sou a única e excelente funcionária (tirando Samy, o jovem cozinheiro) desse estabelecimento, acabei convencendo de me dar esse dia a mais.
- Você vai querer carona hoje, Estela? – A porta foi trancada segundos depois.
-- Não precisa, obrigada. – Agradeci fechando minha bolsa. - Toma cuidado enquanto dirige, você sabe o que aconteceu com a dona Nica uma semana atrás, não queremos um pé quebrado, senhor Jorge. - O abracei de lado sorrindo.
- Tudo bem. Aliás, está com medo de perder seu melhor chefe de todos os tempos?
Jorge tinha em torno dos trinta e cinco anos. Era alto, cor parda, cabelos castanhos claros e os olhos um pouco esverdeado. Ele definitivamente se considerava um homem bonito e elegante. Ele ficou com a lanchonete quando sua mãe, Lúzia faleceu. Não cheguei a conhecê-la, mas pela maneira que ele fala dela tenho a certeza que era ótima chefa assim como ele é um ótimo chefe.
- Anda lendo mentes? E não se esqueça, você me prometeu que iria ao culto no domingo. – O fuzilei com os olhos. – Te encontro domingo de manhã. - Apontei para meus olhos e em seguida para ele.
- Só vou até o prédio para você parar de encher minha cabeça. – Riu. – Até domingo, Estela!
Dei um breve tchauzinho com a mão rindo da sua cara e comecei a caminhar na direção contrária dele. A rua estava um pouco movimentada por ser uma noite de quinta-feira, o que me deixava mais tranquila por um lado. Não que seja extremamente perigoso andar nessa parte do bairro, mas não sabemos o que pode acontecer daqui cinco minutos.
Seria cerca de vinte e dois quarteirões até chegar na minha casa. Dez mil e sessenta passos dados com precisão. Mas, eu não estava afim de encara-los a pé. Já tinha feito a caminhada do dia só pelas poucas horas que trabalhei hoje na lanchonete.
A música Elohim não saia da minha cabeça. Parecia que a mente da minha mente estava cantando junto com a minha mente. Parece loucura isso, eu sei, mas é a pura verdade. O novo álbum da minha banda preferida estava incrivelmente esplêndido, maravilhoso, o melhor dos melhores sem sombra de dúvida.
O sinal fechou para mim na terceira esquina. A parada do ônibus estava do outro lado. Apoiei-me no poste ao meu lado esperando o (1) um minuto que parecia horas, passar. Algumas risadas um pouco alta demais começaram a se aproximarem. Devagar, virei o rosto e pude ver que eram cerca de três garotos, homens?! Segurei firme a minha bolsa e tentei ao máximo não sentir medo. Tenho até um pouco de experiência em disfarçar, fiz algumas peças de teatro quando estava no colegial. Olhei para o semáforo e ainda faltava trinta segundos. Meu Deus, que demora.
- Se eu te pego de jeito, gatinha. – Ouvi uma voz atrás de mim. – Você não iria andar no outro dia. - Aquilo fez todo meu corpo se arrepiar de nojo.
Permaneci parada olhando para o semáforo. E fingir que não tinha ouvido aquilo era o certo a se fazer até que o semáforo abrisse para mim. Mas as risadas ainda continuavam atrás de mim.
- Parece que essa foi fraca, Justin. - Ouvi uma voz mais baixa do que a primeira.
Senhor, por favor... Abre esse sinal para que eu possa sair daqui.
- Hoje não é um dos meus melhores dias, deve ser por isso. – Respondeu atrás de mim com o tom da voz sem ânimo. Talvez tenha se arrependido por agir assim. Mas, eu não ousei olhar para trás e me certificar disso.
Quinze segundos. Vamos, são apenas quinze segundos. O que pode acontecer em quinze segundos?
- Acho que ela está incomodada. – Um dos garotos falou dando um passo, ficando completamente ao meu lado. – Espera aí! Essa é aquela garota da igreja da minha avó.
Revirei os olhos com seu comentário e então o encarei. Ele havia um bigode e usava boné. Aquilo não combinava com ele, mas evitei demonstrar isso com as minhas sobrancelhas franzidas acima dos olhos.
- Qual? – Mais um ao meu lado. Eu estava completamente perdida. O pior é que eu nem tinha trago meu spray de pimenta.
Cinco segundos, depois disso posso sair daqui com passos ligeiros.
- Dizem que as crentinhas são as melhores...
Eu não fiquei para ouvir o resto da "conversa" daqueles filhos da Babilônia pra não chamarem de outra coisa. Quando percebi já estava no outro quarteirão agradecendo a Deus. Olhei de relance para trás e os vi parado no mesmo lugar. Suas mãos gesticulavam enquanto conversavam. Eu não tinha mais a atenção deles sobre mim, isso me trouxe um pequeno alívio. Mas um deles me observava. Suas duas mãos nos bolsos da calça estavam firmes era evidente aquela tensão.
Ouvi o barulho do ônibus. Me aproximei mais da plataforma e esperei para que pudesse adentrar e voltar para a casa. Mas eu ainda podia sentir seu olhar sobre mim até que eu o perdesse de vista.