Quando jovem, Amélia sonhava em ser uma grande chefe de cozinha. Mas a vida fez outra escolha por ela. Vivendo bem no seu casamento com Wallace, sendo um casal de dar inveja em todos com quem conviviam, ela descobre a verdade por trás da perfeição. Sem casa, familia e dinheiro, ela começa a buscar a sua felicidade. Passando por uma gigante travessia de sentimentos e encontros, ela percebe que a felicidade está onde menos procurou.
O dia perfeito existe. É aquele em que você acorda sorrindo e pensando em como sua vida está indo bem e feliz, mesmo com algumas dificuldades como boletos para pagar. Você olha para a pessoa ao seu lado e diz: SIM, esse é o cara com quero viver o resto dos meus dias. Foi o que eu senti olhando para ele dormindo em nossas cobertas quentes. Coberto até o pescoço, em um sono profundo e até mesmo roncando. Nada no mundo me faria querer outro lugar para estar se não ali, envolvida com o calor do corpo dele. Mexi em seu cabelo e ele sorriu, um sorriso lindo e cativante.
Estávamos casados a cinco anos, tudo era tão perfeito. Nesse momento veio a lembrança de como nos conhecemos, uma festa chata de aniversário, onde nos olhamos e nos conectamos no mesmo momento. Rimos a noite inteira e ali me apaixonei por esse belo moreno com a barba falhada.
Levantei da cama e coloquei meu roupão quente, perfeito para esse dia frio. Caminhei pela nossa casa perfeita, feita sob medidas para nós. Preparei o café, cozinhei alguns ovos e peguei duas fatias de pão. Em alguns minutos ele levantaria para fazer sua corrida matinal, sempre levava de vinte a trinta minutos para voltar. Levei na cama e o acordei com um beijo delicado e doce e com um enorme sorriso.
- Bom dia, meu amor - disse.
- Bom dia - disse com a voz rouca - que horas são?
- Exatamente seis da manhã e eu preparei seu café.
Ele sentou na cama. Sem camisa e mostrando seu belo peitoral, que me fez ficar vermelha. Pegamos nossas xícaras e me sentei ao seu lado. Apreciamos o dia clarear enquanto tomávamos em silêncio. De repente ele sorriu e virou seu rosto, nos beijamos e aquilo nos aqueceu de maneira que não poderíamos fazer outra coisa além de nos amar. Um sexo quente e vibrante da manhã. Entrelaçados um ao outro de tanto prazer. Como eu disse, o dia perfeito existe. Após terminar o sexo e o café, ele levantou rapidamente da cama e foi para seu banho. Comi meu pão e os ovos, enquanto observei a chuva chegar.
- Com essa chuvinha nem da vontade de correr - disse saindo do banho com a toalha enrolada na cintura.
- Bom seria ficar debaixo das cobertas comigo - sorri com malícia.
- Verdade- ele sentou na cama e comeu o pão - mas hoje tenho uma reunião com os investidores e mesmo se não sair para correr tenho que me preparar.
- Eu sei, está a quase dois anos tentado essa reunião. Por isso á deixei sua roupa preparada ontem e sua pasta também.
- O que seria de mim sem você - ele me beijou.
- Seria mais rico.
- Verdade - ele riu - por isso preciso ir, para você gastar mais.
Olhei ele levantar e começar a se vestir - pensando nisso, queria conversar com você. - Diga - ele pegou a gravata que separei e sorriu.
- Queria voltar a trabalhar - ele me olhou quando terminei de falar e então continuei - sinto saudade da rotina, de fazer o que gosto.
- Prefere esquentar a barriga no fogão pros outros do que pro seu marido?
- Bem, não deixaria de fazer para você. Mas sempre sonhei em ser uma grande chefe, você sabe.
- Sei e combinamos que você ficaria em casa sendo minha esposa.
- Posso ser os dois.
- Amélia, você está parecendo aquela jovenzinha que conheci a cinco anos atrás e como fica nossos filhos?
- Nós não temos filhos, Wallace.
- Mas vamos ter um dia e até lá é melhor você se concentrar em ser uma boa dona de casa.
Ele estava certo? Dentro de mim a enorme vontade de voltar a trabalhar, mas também de continuar nossa rotina de casados. Ele terminou de se vestir e me deu um beijo, levantei e levei a louça para a pia. Fui para a sala e peguei a pasta o aguardando na porta. - Tenha um ótimo dia - eu disse.
- Você também e vê se não vai gastar demais - ele pegou a pasta e saiu.
Voltei para a cozinha e lavei a louça. Respirei fundo e coloquei uma música para ouvir, depois do banho me preparei para a rotina de limpeza da casa. Não havia muito para arrumar além da cama, quando terminei peguei meu caderno de receitas para estudar. Vi alguns vídeos de técnicas novas e testei algumas. Lembrei que era dia de compras e então peguei a chave do carro e minha bolsa, sai de casa segui para a garagem. Entrei no carro e percebi que os retrovisores estavam errados. Arrumei e então liguei. Segui a caminho do mercado, ouvindo musicas que o Wallace havia separado para nós, que incrivelmente contava apenas com músicos homens, o que era engraçado. A chuva estava um pouco mais forte e ao parar no sinal perto do mercado olhei ao redor. Me chamou a atenção um carro parecido com o dele parado em frente a uma loja de roupas femininas, mas obviamente não era ele. Continuei meu caminho até o mercado e lá chagando estacionei e peguei minha bolsa, que abriu deixando tudo cair aos pés do carona - parabéns Amélis - disse a mim mesma. Achei um recibo de compras e peguei colocando no bolso do casaco. Peguei tudo e coloquei de volta na bolsa e então sai.
Dentro do mercado fui pegando os produtos que precisava para preparar um jantar maravilhoso, também peguei alguns doces para fazer a sobremesa. Passando pelo corredor de limpeza observei os preços absurdos que estavam, separei no carrinho os que usávamos mesmo sabendo que a conta seria cara. Continuei a procurar um sabão liquido para louça quando um homem esbarrou em mim - desculpa - eu disse.
- Fui eu quem esbarrou e quem devia pedir desculpas - ele disse sorrindo.
- Tudo bem - falei sem ao menos o olhar novamente.
Ele ficou parado me olhando, então sorri e me virei para os produtos.
- Sempre procurando o melhor - ele disse - não é mesmo, Amélia?
O olhei frisando a testa e cerrando os olhos para tentar reconhecer - desculpa, nos conhecemos?
Ele riu - claro que não vai lembrar de mim - olhou para o meu carrinho - continua a mesma, comprando sempre produtos com qualidade boa para cozinhar, mesmo que pague a mais.
- Vicente? - perguntei.
- Isso - ele disse feliz.
- Caramba - eu disse ao lembrar dele perfeitamente - você está muito diferente.
- Bem faz quase seis anos que não nos vemos - ele ficou sem jeito e colocou a mão na cabeça - era para ter mudado não?
- Jamais imaginaria que te encontraria em Porto Alegre de novo, a última vez que nos vimos você estava indo para Alemanha aprender sobre - parei para tentar lembrar - Schnitzel - falamos juntos. Começamos a rir - como foi lá?
- Bem, foi completamente do jeito que achei que seria, difícil de se comunicar e de cozinhar, considerando que tudo lá é praticamente encontrado em latas.
- Pelo menos aprendeu a falar alemão?
Ele pronunciou algumas palavras estranhas e riu.
- O que significa isso? - perguntei.
- Bom dia - disse ele.
- Ah, por favor - eu disse rindo - aprendeu só isso?
- Aprendi o básico sim - ele riu - lembrei de você lá, quando vi um restaurante de comidas brasileiras. Eles eram especialistas em carnes e churrascos.
- Uau, eu nem imagino como deve ter sido maravilhoso.
- E você, já está trabalhando em um restaurante cinco estrelas como dizia?
- Bom, eu - fui interrompida pelo toque do meu celular - só um instante - atendi - oi amor, estou no mercado fazendo as compras, posso te ligar daqui a pouco?
- Só queria dizer que você está falando com o novo consultor da Precare - ele falou contente. - Não acredito, você conseguiu.
- Claro, hoje vamos comemorar muito então já compra um champanhe para nós.
- Pode deixar, vou fazer aquele cassoulet que você ama. Te amo.
- Também - ele desligou.
- Vejo que continua cozinhando - disse Vicente.
- De certo modo, olha, me desculpa Vicente, mas tenho que ir. Posso te adicionar no instagram?
- Claro - alcancei meu celular e ele fez o restante - a gente se vê - disse me devolvendo o aparelho.
- Caro, até mais.
Ele sorriu e saiu de perto, o observei e então notei em como estava bem arrumado. Segui para o caixa, pensando em como a vida era diferente do que a gente sonha. Sempre me imaginei em algum país diferente e cozinhando as receitas mais maravilhosas. Jamais poderia pensar que iria casar e deixar meus sonhos para trás, mas com certeza um dia iria poder voltar e fazer o que sempre sonhei. Após a mulher do caixa passar as compras peguei a bolsa e tentei achar o cartão, mas não estava lá, coloquei a mão no bolso e junto dele peguei o comprovante que estava no carro. Passei o cartão e então segui para onde estava o estacionado. Guardei tudo no porta malas e fechei, sentei no carro e percebi ainda estar com o papel na mão. Abri para ver e era um comprovante de uma loja de roupas. Provavelmente o Wallace me comprou um presente e então olhei a data.
- Que estranho - falei em voz alta - ele estava viajando nesse dia.
Decidi deixar para depois e guardei o papel. Sai com o carro e segui o caminho para a casa e nesse momento comecei a pensar sobre como deveria ter sido a viagem de Vicente para a Alemanha. Ele estava muito bem, se tornará um homem bonito, bem sucedido e educado - não que não fosse antes. Vicente era exatamente o tipo de pessoa que é fácil de gostar, tanto amigável quanto romanticamente, isso sempre foi incrível. Por um segundo me imaginei cozinhando em uma restaurante grande e chique, sendo chamada de chefe e celebrando um prato lindo e feito por mim. Meu devaneio passou quando notei que cheguei em casa sem mesmo ver o caminho que fiz. Desci do carro e abri o porta malas, peguei as compras e levei para casa. Geralmente preciso da ajuda do homem forte e saudável que tenho em casa. Wallace era a figura perfeita de um homem com trinta e três anos, tinha um pouco de grisalho em seu cabelo curto e na barba - que como disse era falhada - dando um charme a mais. A pele dele não era clara e nem tão escura também e os olhos eram completamente castanhos, mas eram perfeitos. Parei de pensar no meu marido antes que me perdesse nos pensamentos e em nossas deliciosas noites quentes.
Comecei a preparar o mise en place de nosso jantar romântico. Separando cada produto e deixando-os em pedaços pequenos. Comecei a cozinhar nossa feijoada francesa, prato que Wallace mais gostava que eu fizesse para ele é digno de comemoração. Geralmente serviria cassoulet com vinhos tintos, mas ele queria um champanhe para o momento e então acatei o pedido. Aproveitei o tempo de cozimento para tomar um banho rápido e me preparar. Coloquei minha calça preta e uma regata, seguido do meu casaco de tricô amarelo claro, os cabelos deixei soltos, uma maquiagem leve e nos pés um tênis confortável. Ouvi a porta abrir e corri para a sala.
- Olha quem chega - disse sorrindo - o mais novo ricaço da cidade.
- Não é pra tanto - ele riu.
Dei um abraço apertado e em seguida um beijo em seus lábios lindos. Ele largou a pasta e me agarrou pela cintura. Tivemos um momento mágico em um beijo longo e gostoso - a comida vai queimar - disse ainda o beijando.
- Está certa, o que fez hoje? - perguntou quando me soltou.
- Fiz o cassoulet, como disse que faria - falei indo para a cozinha - não prestou atenção?
- Claro que não, estava terminando o contrato - disse tirando o paletó e colocando na cadeira - como foi o mercado?
- Ah, nem imagina. Encontrei com um colega de faculdade, o Vicente - disse sem me preocupar - ele viajou para a Alemanha para estudar.
- É mesmo? Que bom para ele.
- Me deu uma saudade da cozinha de restaurante, a adrenalina de servir os pratos - disse arrumando a panela na mesa.
- Não vai começar novamente com aquelas bobagens de voltar a trabalhar, não é?
- Não é bobagem, era o meu sonho.
- Amélia, por favor - ele disse sentando - essa noite quero comemorar com você e não me estressar.
- Eu não entendo porque esse assunto te estressa tanto - sente na frente dele - sendo que eu só iria trabalhar e não ia deixar de fazer nada em casa.
Wallace começou a se servir, de modo que a comida caia de seu prato. O silêncio absoluto tomou conta da sala, até que ele me olhou profundamente dentro dos olhos - comprou o champanhe? - perguntou.
- Sim, mas vinho tinto combina mais com essa comida - falei apontando para o vinho em cima da estante.
- Pronto - ele disse tirando o relógio do pulso e jogando na mesa - acabou de estragar meu momento - sua voz que antes era baixa e tranquila, começou a aumentar - eu só queria chegar, comer e abrir um champanhe com você.
- Mas podemos abrir o champanhe, foi apenas uma sugestão - eu disse tentando esconder o quanto ele me assustava daquela maneira que estava.
- Vou comer no quarto - ele levantou da mesa e saiu antes mesmo que eu protestasse.
Abaixei minha cabeça e respirei fundo. Eu acabara de estragar o jantar de comemoração dele e por tão pouco que cheguei a perder a fome. Como podia minha profissão o irritar tanto e pior, eu saber disso e ainda insistir? Como pode eu ser uma esposa tão desatenta a ponto de negligenciar o dia dele? Suspirei. Levantei da mesa e coloquei meu prato na pia junto dos copos e talheres. Guardei a comida e me servi uma taça de vinho. Após esperar que Wallace saísse do quarto - o que não aconteceu - peguei seu paletó, o cheiro e uma mancha de cachorro quente de esquina me fez sentir cada detalhe da gordura que eu demoraria para tirar da roupa. Coloquei a mão nos seus bolsos para tirar o que tinha e vi um papel parecido com o comprovante que achei no carro. Era a mesma loja, então guardei e segui para o quarto.
Ao abrir a porta, Wallace estava deitado lendo seu livro de cabeceira, me sentei ao seus pés e arrumei o cabelo para trás.
- Me perdoe meu amor - disse arrependida - não devia ter dito aquilo ou ter te importunado no seu dia - ele se manteve no livro e em silêncio e então respirei fundo - Wallace, me perdoe, de verdade.
- Eu - colocou o livro na cômoda - posso - sorriu e me olhou - te perdoar sempre por qualquer coisa que for - eu sorri feliz e o abracei, então ele continuou - não vamos brigar - com apenas uma mão ele me virou - vamos comemorar - disse beijando meu pescoço.
Aqueles beijos no pescoço trouxeram um calor gigante para meu corpo, cada vez que ele se afastava e beijava novamente, eu me sentia mais viva. Cada vez que descia pelo meu corpo, um arrepio interminável tomava conta de mim sem que eu pudesse controlar. Tivemos uma de nossas noites mais quentes em um sexo bruto e selvagem. Mas ainda sim, algo me incomodava, em quanto ele seguia descendo o meu corpo e me jogando de um lado para o outro, meu pensamento foi para a sala, para aquele pequeno papel que estava no meu carro e no seu bolso.
Acordei com o corpo dolorido, como se um carro tivera passado por cima de mim, mas não fora um carro e sim Wallace, tomado por tesão e desejo bruto. Nunca havia feito algo daquele tipo antes, ele sempre prediria que o sexo fosse tranquilo e sem agressividade. Realmente me surpreendendo na noite anterior. Quando decidi levantar, Wallace já estava pronto para sair, ele sorriu ao me olhar. - Devíamos brigar mais vezes - disse colocando o relógio.
- Estou moída - reclamei colocando a mão no ombro - não precisa apertar tanto.
- Você está muito reclamona, daqui a pouco vou procurar outra e não vai adiantar me culpar - disse rindo.
- Credo, Wallace, que brincadeira sem graça - levantei enrolada na coberta - escute, esqueci de comprar o filtro do aspirador, recuso dinheiro.
- Usa o cartão.
- Meu cartão tá perto do limite.
- Você só gasta, tem que maneirar Amélia - ele jogou a carteira na cama - vou escovar os dentes, pegue o quanto precisa.
Peguei a carteira e abri, não foi difícil achar uma quantidade absurda de notas de cem, mas o que chamou a atenção foi outro comprovante da mesma loja. Aquilo já estava ficando estressante, peguei o dinheiro e o comprovante. Ele saiu do banheiro e pegou a carteira. Finalizou com o paletó e a pasta, me deu um beijo e saiu sem dizer mais nada - tchau, também te amo - gritei - ele é extremamente difícil as vezes - segui falando comigo mesma - vamos lá Amélia, vamos lá - peguei os três comprovantes e me sentei na mesa para analisar. Coloquei um ao lado do outro e pasmem, eles tinham valores absurdos, dias iguais e vendedora também. A compra era feita sempre nas quintas feiras, no período da tarde e com uma tal de Luciana.
Sem pensar duas vezes guardei os comprovantes na bolsa e segui para meu banho, rápido, veloz e pratico. Coloquei uma roupa de ginástica e presunto cabelo para caso precisasse correr atrás de alguém. Mas o que era menos provável considerando que eu não sabia de nada. Nunca desconfiara de Wallace, jamais precisei. Mas aquilo já estava demais, peguei a chave do carro e segui para a loja do comprovante. Pasmem, era a loja que imaginei ter visto o carro dele parado, agora já não tinha certeza se não era ele.
Estacionei na frente e sai do carro, nervosa e tentando tirar a ideia de que Wallace me traia da cabeça. Entrei na loja e aguardei que alguma vendedora viesse, mas estavam todas ocupadas com outros clientes, me direcionei para onde estava o caixa de pagamento e aguardei alguém vir.
- Olá, posso ajudar? - perguntou uma mulher. - Pode, estou procurando uma vendedora chamada Lucia - disse rápido e quase trêmula. - Ah, bom, sou eu mesma - ela disse sorrindo - veio pegar alguma encomenda digital?
- Não, aparentemente meu marido compra aqui com vocês com frequência e sempre com você. Wallace Lourenço, se recorda? - perguntei ironicamente. Bem eu não sou o tipo de mulher que discute com outra por causa de homem, mas realmente estava aflita e querendo uma explicação plausível para não perder o réu primário com meu marido.
- Ah, sim - ela riu - o senhor seu marido é um cliente assíduo aqui da loja, um ótimo cliente. - E só tem você de vendedora dessa loja? - perguntei com ironia.
Ela apenas riu e levantou a sobrancelha. Deu as costas e seguiu para a porta para atender uma cliente que entrava. Naquele - apenas naquele - momento, eu queria ter menos sororidade e xingar ela na frente de todas ali, mas não haviam provas e nada e nem mesmo tinha algo para questionar. Era apenas uma esposa surtada e ciumenta. Com minha cabeça baixa, irritada e totalmente ridicularizada, sai da loja e tentei contatar o Wallace, mas aparentemente celular é feito para apenas tocar e não ser atendido. Em frente a loja, do lado outro lado da rua, um café pequeno e movimentado era perfeito para esse momento. Entrei e sentei de frente para a loja, logo em seguida fiz meu pedido. Peguei os comprovantes e analisei com mais frieza, então tínhamos um padrão: primeiro, Wallace sempre comprava valores altos, coisas de cinco dígitos, para uma loja pequena e com preços não tão caros, era bastante. Segundo, sempre quem o atendia era a Luciana, a vendedora simpática e irônica que me deixou sozinha. E por último, as datas eram sempre compatíveis nos dias, as quintas feiras. Era quase inacreditável.
Sentada naquele café, pensando em tudo que acontecia, em como a vida é completamente diferente do que a gente planeja as vezes, peguei meu celular e dei uma de stalker. Entrei no perfil de Vicente e comecei a ver suas poucas postagens totalmente organizadas. Praticamente todas eram dele na cozinha e em diversos países, a que mais me chamou a atenção era ele fazendo NAAN, o pão típico da Índia. Com um sorriso esmagador e totalmente invejável. Como pude abdicar da cozinha sem ao menos pestanejar? Simplesmente aceitei casar Wallace e desiste de qualquer sonho para que ele pudesse viver os dele. Mas ao mesmo tempo, antes me sentia completa e feliz por ser apenas sua esposa, será que eu mudei? Será que rever o passado e ver as conquistas dos outros me fizeram querer ser mais? Bem, seja o que for, decidi me levantar e sair do café, seguindo para o carro e então direto para minha casa.
Chegando, vi o carro de Wallace já estacionado. Nem me dera conta que já era hora de ele estar em casa. Fiquei mais um tempo sentada e tentando imaginar o que significava ou não aqueles comprovantes. Desci do carro e entrei em casa, ele estava sentado no sofá tomando um chá e lendo o jornal. Me viu e disse apenas - achei que tinha ido embora - seu tom de brincadeira me fez querer dar em sua cara. Como ele podia estar me traindo? E ainda por cima estar bancando? Me sentei ao seu lado e tentei sorrir, sem sucesso algum. Eu já estava paranoica ou era minha intuição?
- Eu fui conhecer a sua loja favorita - disse sem disfarçar a raiva, joguei os comprovantes em seu colo - e sua vendedora também.
Ele pegou os papéis e olhou, começou a rir e então jogou de volta - o que acha que é isso? - ele perguntou rindo.
- O que eu deveria achar? Que você tem uma amante é claro e que banca ela - levantei do sofá - como pode fazer isso comigo?
- Amante? Amélis, você sempre sendo precipitada - ele levantou e chegou perto - meu amor, eu compro para minha mãe, ela que me deu o endereço e o nome da vendedora que atende ela - ele passou a mão no meu rosto.
- Sua mãe? Aquela loja não combina muito com ela - eu disse. Mas admito que estava ficando mais leve e menos em pânico.
- Liga pra ela e confirma - ele me abraçou - acha mesmo que eu iria te trocar? Nunca.
Ah, que alívio! Senti meu corpo perder dez quilos e o abracei - minha vontade era de matar você - disse o apertando - tive tanto medo, por que não me falou?
- Não era algo importante e nem relevante, mas me desculpe te preocupar - ele disse me soltando aos poucos.
Então novamente me vi em seus braços, como eram quentes e fortes, me senti extremamente excitada. As brigas que estavam acontecendo frequentemente deixavam nossas noites mais agitadas. Então fomos para o nosso quarto e ali mais uma vez nós amamos. Mas Wallace parecia mais forte, o peso de seu corpo sobre o meu quase me sufocava. Seus apertos e mordidas também estavam mais intensos e quando puxou meu cabelo, pude sentir alguns fios arrebentarem. Estranhamente ele começará a ser mais selvagem, por assim dizer.
Quando acordamos, estava novamente dolorida, mas dessa vez não me importei. Ele rapidamente levantou da cama e seguiu para o banho. Meu celular vibrou e então vi ser uma mensagem de Vicente: "venha conhecer meu novo restaurante em uma linda inauguração, com pratos típicos de diversas culturas" e o endereço. Novamente a inveja tomou conta de mim. Decidi que iria na inauguração, que poderia assim ver o que perdi nos últimos anos. Wallace saiu do banho e sorridente meu deu um beijo.
- Fui convidada para uma inauguração de restaurante hoje, vamos comigo?
- Lamento amor, hoje tem minha viagem de negócios- ele disse se vestindo.
- Se importa se eu for sozinha?
- Claro que não, só não vai comer demais para não acabar engordando, sabe como são essas comidas de restaurante, te enchem de bicarbonato para comer menos e pagar mais - as vezes gostaria que Wallace se reconhece na sua ignorância.
- Não é assim que funciona, mas tudo bem - eu disse me levantando - quer que eu te leve ao aeroporto?
- Não precisa, a empresa já alugou um carro.
Bem, estava tudo dentro do normal. De duas a três vezes por mês, Wallace viajava e ficava fora cinco a dez dias dependendo de para onde ia. Eu poderia ir sem receio para o restaurante e não precisaria chegar cedo, o que me daria tempo de conversar com Vicente e saber mais sobre suas viagens. O que eu não via a hora de fazer.