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“O amor é surdo frente ao verbo divino e ao esconjuro das bruxas.”
O livro dos abraços – Eduardo Galeano
CADU
Os sons de alerta ressoam ensurdecedores dentro da aeronave, o giro cortante das hélices cada vez mais falhos reverberam pelo meu corpo.
– Mayday, Mayday.
O piloto berra e sem resposta, sei que é chegada a hora.
De repente
Baque!
Escuridão
Eu tinha 24.
Vinte e quatro fodidos anos quando cruzei com a infeliz da bruxa naquela praia.
Seu esconjuro ecoa todos os dias desde então na minha cabeça, lembrando-me que o meu destino, se é que posso chamar assim, seria regido por uma espécie de profecia. Uma profecia ditada pelos lábios daquele ser pagão que gosta de brincar de ser Deus.
Eu mesmo fui educado, ridículas aulas de catequese, intermináveis missas aos domingos e inúmeras conversas com o meu melhor amigo padre, a não acreditar em nada que não fosse divino, mas ironicamente, a barreira do meu ceticismo havia sido rompida depois daquele dia.
– Cadu, vamos! – Antônio me puxa pelo ombro.
– Calma é uma cigana, vai ler a minha mão. – Falo o óbvio mostrando a figura exótica a nossa frente.
– Você sabe que não devemos mexer com essas coisas, não é mesmo? – Ele me repreende com as sobrancelhas erguidas e ar sério. Antônio será padre. – Eles brincam de ser Deus. Brincam com o destino e sabemos a quem ele realmente pertence.
– Nosso destino pertence a nós mesmos, Antônio. Livre arbítrio, já ouviu falar? Deixa de ser careta. Esse negócio de ser padre já o afeta. – Zombo. Antônio é um ano mais velho que eu, mas parece ter 50. Ele dará um bom padre.
– Vamos, o que diz ai? – Viro-me para a bruxa que encara seriamente as linhas da minha mão.
Assim que ela termina de proferir algo que parece ter decorado de um livro místico qualquer, uma espécie de profecia cheia de metáforas, o sorriso até então zombador do meu rosto morre e um frio cortante percorre minha espinha.
Encaro-a sério desta vez e me afasto lentamente sendo guiado pelos braços de um Antônio que parece ter visto a face do capeta, falando coisas que neste momento não sou capaz de compreender, pois estou em suspenso com aquelas palavras.
Baque!
Minhas ações, sentimentos e crenças mudariam a partir daquele dia.
Verbo.
Passado, presente e futuro colidindo-se no que até então eu chamava de vida. Onde a única preocupação eram os estudos, me tornar um grande arquiteto, assumir os negócios da família e, ela.
Deus!
Em ironia minha mente grita o santo nome em vão diante da epifania macabra.
Ela...
Não!
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