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Capítulo

Ele era o sonho de toda mulher. Ela, a esposa perfeita. Mas ninguém imaginava o que acontecia quando as portas se fechavam. Entre jantares caros e promessas de amor, ela aprendeu a sorrir em silêncio, a sangrar por dentro, e a guardar as sobras de um homem que a transformou em nada. Até que o silêncio virou grito. E o amor, crime. Agora, com o corpo do marido em pedaços e o país inteiro assistindo, surge a pergunta que ninguém consegue responder: ela matou por ódio - ou por amor?

Capítulo 1 Prólogo

Naquele momento, eu via tudo o que fiz de errado com Catarina. Cada lembrança, cada palavra dita com arrogância, cada olhar de desprezo... tudo se acumulava diante de mim como um espelho rachado da vida que destruí. Entendia, com uma clareza dolorosa, que fui um idiota completo - e que não haveria mais volta. Não teria outra chance de reconquistar minha mulher, minha família, minha própria casa. Era o fim, e eu estava assistindo à ruína com o corpo sangrando no chão.

Ela estava ali, concentrada, fria, metódica, preparando o material sobre uma mesa improvisada. O som metálico dos instrumentos ecoava pela sala - um clique seco, o arrastar de metal sobre metal - e cada ruído fazia o sangue latejar mais forte em minhas têmporas. Eu sentia o calor úmido escorrendo pelo meu peito, o cheiro ferroso do sangue enchendo o ar, pesado, sufocante. Doía respirar. O tiro que ela deu em meu pescoço por trás ainda queimava como se o projétil tivesse acabado de entrar. E mesmo assim, entre tontura e incredulidade, eu me perguntava quando aquilo começou.

Em que momento aquela mulher - a simples auxiliar de enfermagem que conheci há cinco anos, que ria das minhas piadas e dizia que eu era o amor da vida dela - começou a planejar a minha morte? Como deixei que as coisas chegassem até aqui?

Um pensamento me atravessou como uma lâmina e o pânico tomou conta de mim.

Ela era técnica em enfermagem agora, um pouco mais avançada que a auxiliar de quando nos casamos, mas por que diabos ela tinha todo aquele material cirúrgico? Um jogo inteiro de bisturis elétricos, pinças, sondas, lâminas esterilizadas! Aquilo não fazia sentido. Será que ela iria me picotar? Ela não deveria ter acesso a tudo aquilo. Eu tentei falar, mas a voz saiu falha, arrastada, e ela percebeu meu desespero.

Catarina me olhou e sorriu. Um sorriso calmo, perigoso, e, ironicamente, o mais bonito que já vi.

- Se acalme, marido. Tudo vai ficar bem. Quando você insinuou usar minhas saídas suspeitas para provar ao juiz que eu tenho um amante e deixava nossa filha com as babás pra me encontrar com ele escondido, você pensou em me perguntar o que eu fazia nesse tempo? Não? Mas eu vou te contar: eu fiz um curso de instrumentadora. E precisei fazer estágios para me certificar. Porque foi escondido? Porque quando nos casamos você me obrigou a parar de trabalhar, e disse que era humilhante um CEO importante como você ter como esposa uma simples atendente de postinho de saúde! Agora, minha pequena desobediência vai te servir! Vou tirar essa bala alojada aí, não queremos que isso infeccione e que você morra, não é?

A cada palavra, minha respiração se tornava mais curta. O som do coração parecia ecoar dentro da cabeça, irregular, apressado.

- Você é instrumentadora? O que isso quer dizer? A mulher que fica entregando bisturi e pinças para o cirurgião? Você pensa pequeno, Catarina! Se ia fazer um curso escondido, deveria pelo menos ter feito medicina. Eu ia te respeitar mais.

Ela soltou uma risada breve, sem humor, o tipo de riso que precede o caos.

- Não estou procurando seu respeito, marido. Não mais! Fiz o curso para não enlouquecer de tédio, procurando encaixar na minha vida sem graça, alguma coisa que me fizesse bem além de ser mãe, enquanto você vivia sua vida de solteiro, regada a luxo, bebidas e prostitutas. Foi como uma realização pessoal, não foi para você!

Aquela mulher - minha mulher - falava com tanta serenidade que o ódio parecia ter se transformado em algo pior: uma espécie de paz insana.

- Porque é disso que se trata! Você também é uma prostituta, que eu paguei muito caro!

As palavras saíram emboladas, cuspidas entre o gosto de sangue e conhaque que me subia à garganta. Eu sentia as forças me abandonando. As bordas da visão escureciam, e o rosto dela, iluminado pela luz amarelada do abajur, parecia o de uma santa cruel, quase angelical.

Catarina se aproximou devagar, a sombra dela se projetando sobre mim.

- Shiiii, não fale, querido. Poupe suas energias. O processo agora vai ser complicado. Como instrumentadora, eu posso ter um kit cirúrgico para estudo e treinamento, mas o meu certificado só vai até aí. Não posso, por exemplo, ter acesso a anestésicos ou drogas para cirurgia, nem acesso a pele humana para treinamento. Então, vamos fazer igual nos filmes do velho oeste, tá bom? Toma um pouquinho desse conhaque pra suportar e vamos começar!

Ela falava com uma leveza absurda, cantarolando enquanto se preparava. A melodia era sertaneja, uma daquelas que ela ouvia quando limpava a casa, e que eu sempre mandei ela abaixar porque me irritava. Agora, o som parecia grotesco, quase macabro.

Catarina se aproximou, me segurou pelo queixo com delicadeza - uma delicadeza que doía mais do que o ferimento - e despejou o conhaque goela abaixo. O líquido queimou tudo por dentro, e o mundo girou.

Ao som da voz melodiosa dela cantando:

"De cê ter traído, de cê ter mentido, de cê ser um bostaaaa..."

ela enfiou o dedo no buraco aberto no meu pescoço, sem anestesia, sem piedade, procurando a bala. A dor foi indescritível - um clarão branco atravessou minha mente e tudo se dissolveu num grito mudo.

Antes de desmaiar, a última coisa que ouvi foi a voz dela, doce e afinada, cantarolando:

"então mente aí, que a culpa é nossa..."

E o silêncio me engoliu por completo.

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