Ensurdecido pelas Suas Palavras Odiáveis

Ensurdecido pelas Suas Palavras Odiáveis

Gavin

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Capítulo

Por oito anos, eu abri mão da fortuna da minha família e da minha audição para ajudar meu namorado, Emiliano Rocha, a se tornar um astro do rock. Eu era sua musa, seu anjo da guarda, a sócia silenciosa em seu sucesso. Então, um milagre aconteceu: minha audição voltou. Bem a tempo de pegá-lo com uma universitária e ouvi-lo me chamar de "fardo" e "caso de caridade". A traição não parou por aí. Quando a nova garota dele bateu o Opala antigo que meu falecido pai me deu, eu a confrontei na delegacia. Emiliano correu para lá, não para me defender, mas para protegê-la. Ele me empurrou com tanta força que eu caí no chão, e o mundo ficou em silêncio novamente. Minha audição se foi, pela segunda vez, por causa dele. "Você é surda?", ele gritou para mim, furioso por eu não simplesmente perdoá-lo. "Eu te dei tudo! Era exaustivo, sufocante!" Eu olhei para o homem por quem sacrifiquei tudo, o homem que tinha acabado de me destruir mais uma vez. Ele não fazia ideia de que eu tinha ouvido cada uma de suas palavras odiosas. "Não, Emiliano", eu disse, minha voz clara e firme. "A pergunta é: você é surdo? Ou você é só um covarde?"

Capítulo 1

Por oito anos, eu abri mão da fortuna da minha família e da minha audição para ajudar meu namorado, Emiliano Rocha, a se tornar um astro do rock. Eu era sua musa, seu anjo da guarda, a sócia silenciosa em seu sucesso.

Então, um milagre aconteceu: minha audição voltou. Bem a tempo de pegá-lo com uma universitária e ouvi-lo me chamar de "fardo" e "caso de caridade".

A traição não parou por aí. Quando a nova garota dele bateu o Opala antigo que meu falecido pai me deu, eu a confrontei na delegacia. Emiliano correu para lá, não para me defender, mas para protegê-la. Ele me empurrou com tanta força que eu caí no chão, e o mundo ficou em silêncio novamente. Minha audição se foi, pela segunda vez, por causa dele.

"Você é surda?", ele gritou para mim, furioso por eu não simplesmente perdoá-lo. "Eu te dei tudo! Era exaustivo, sufocante!"

Eu olhei para o homem por quem sacrifiquei tudo, o homem que tinha acabado de me destruir mais uma vez. Ele não fazia ideia de que eu tinha ouvido cada uma de suas palavras odiosas.

"Não, Emiliano", eu disse, minha voz clara e firme. "A pergunta é: você é surdo? Ou você é só um covarde?"

Capítulo 1

Ponto de Vista de Adell:

O mundo se estilhaçou não com um estrondo, mas com um anúncio pop-up de um site de fofocas de celebridades classe B no meu celular.

Minha mãe, Cristina Salles, tinha me avisado. A voz dela, afiada como um diamante, cortou o ar luxuoso da nossa cobertura na Avenida Vieira Souto, oito anos atrás. "Adell, esse músico, Emiliano Rocha, ele é um sonhador. Sonhadores partem corações, e eles certamente não constroem impérios." Ela estava parada ao lado do piano de cauda, seu robe de seda brilhando, um retrato da desaprovação polida.

Mas eu era jovem, tola e ferozmente apaixonada. Emiliano tinha fogo nos olhos, um violão pendurado no ombro e uma melodia que prometia uma vida muito mais rica do que qualquer herança. Eu fiz uma única mala naquela época, deixando para trás a gaiola dourada e a mulher que via o amor como uma transação. Eu persegui a música, a garra, o caos cru e belo de uma vida com ele.

Eu me lembrava do incêndio no estúdio como se fosse ontem, embora oito anos tivessem embaçado tantas outras coisas. O cheiro acre de fios queimando, Emiliano tentando freneticamente salvar sua nova mesa de som, o estalar das faíscas. "Fica pra trás!", ele tinha gritado, mas eu vi o equipamento caindo, pesado e quente. Eu o empurrei para longe, senti a dor lancinante quando um amplificador caiu, esmagando meu ouvido esquerdo. O mundo ficou em silêncio daquele lado, um vazio opaco e algodoado que se tornou meu companheiro permanente. "Minha garota corajosa", ele sussurrou na emergência, seus olhos úmidos com uma gratidão que parecia uma promessa. "Eu te devo tudo, Adell. Minha vida, minha música, meu futuro. Você é minha musa, meu anjo da guarda."

Ele se ajoelhou ao lado da minha cama de hospital e colocou a mão sobre meu ouvido bom, gesticulando furiosamente em LIBRAS: "Eu te prometo, Adell. Na alegria e na tristeza. Você é meu para sempre." Suas palavras ecoaram em minha mente, um voto sagrado.

E ele manteve sua promessa, de certa forma. Sua carreira decolou. O músico batalhador se tornou uma sensação global. Discos de platina, arenas lotadas, um loft gigantesco na Vila Madalena que agora parecia mais um santuário do que um lar. Ele me adornou com roupas de grife, joias brilhantes e uma vida de luxo sem esforço. Tudo que eu precisava, materialmente, estava ao meu alcance. Nosso casamento, um evento grandioso planejado para o próximo mês, era o ápice da nossa jornada, uma celebração de oito anos de sacrifício e sucesso.

Eu estava rolando meu feed, procurando inspiração para as lembrancinhas do casamento, quando o pop-up apareceu. "O Amor Secreto de Emiliano Rocha: A Confissão de uma Universitária." Meu polegar congelou. Meu estômago se contraiu. Era uma postagem de blog, um fio longo e confuso de alguém chamada Keisha Matos.

"Meu Deus, gente, o Emiliano é o mais fofo! Ele me entende totalmente. Diferente de certas pessoas..." A postagem vaga insinuava algo mais, um relacionamento secreto, alfinetadas veladas. Meu coração começou a bater em um ritmo frenético. Parecia que eu estava de volta ao estúdio em chamas, só que desta vez o fogo estava no meu peito.

A seção de comentários era um ninho de cobras. "Isso é sobre a noiva surda dele? Coitada da Adell." "Ele com certeza merece alguém melhor que uma mulher quebrada." "Acho que ele se cansou de gritar, hein?" As palavras, cruéis e casuais, me açoitavam. Eles discutiam meu relacionamento, minha perda de audição, como se eu fosse uma figura distante e patética.

"A traição", dizia um comentário, "é uma música melhor cantada a dois. Mas só um consegue dançar." A implicação era clara: Emiliano estava me traindo. E essa Keisha Matos estava se deliciando com isso.

Emiliano havia cancelado nosso jantar de aniversário, na noite anterior. "Emergência no estúdio, amor", ele sinalizou, seus olhos evitando os meus. "Prazo apertado. Você sabe como é. A gente comemora direito depois da turnê." Suas palavras, embora sinalizadas, pareciam ocas, como um tambor sem pele.

Lembrei-me de encarar a mesa elaborada que eu havia preparado, as velas bruxuleantes, o champanhe perfeitamente gelado. Tudo para nada. Sozinha no loft silencioso, o silêncio parecia mais pesado do que o normal, um cobertor sufocante. Eu até tive uma consulta de acompanhamento com meu fonoaudiólogo naquele dia. "Notável, Adell", disse o Dr. Lins, olhando para o meu canal auditivo. "O dano no nervo parece estar... revertendo. É quase um milagre. Você está recuperando alguma função."

Eu quase ri na hora, a ironia era afiada demais. Minha audição, finalmente voltando depois de todos esses anos, bem a tempo de quê?

Cliquei no perfil de Keisha Matos. Uma cascata de fotos inundou minha tela. Ela, rindo com Emiliano. Ela, pendurada em seu braço em uma balada. Ela, usando a jaqueta de couro vintage dele - a que eu comprei para ele anos atrás, a que ele jurou que nunca deixaria ninguém mais tocar. Minha respiração falhou. Ele estava usando um relógio novo, um design prateado e elegante que eu nunca tinha visto antes, brilhando sutilmente em todas as fotos dela. Não era o de ouro antigo que eu lhe dei em sua primeira grande turnê.

Um nó frio e duro se formou no meu estômago. Não era mais apenas especulação. Era real. Era gritante e dolorosamente real. Minha visão embaçou, lágrimas quentes ardendo em meus olhos. Senti um grito subindo pela minha garganta, mas ele morreu ali, sufocado por uma onda de náusea. Meu corpo tremia, cada terminação nervosa gritando em protesto.

Peguei meu celular, os dedos atrapalhados no teclado. "Onde você está?", mandei por mensagem.

A resposta dele veio minutos depois: "Ainda no estúdio, amor. Problemas enormes. Não me espera acordada."

Eu digitei: "Posso ir aí? Levar algo pra você comer?"

Silêncio.

Não, não silêncio. Uma nova postagem de Keisha Matos brilhou no meu feed. Um vídeo curto. Ela em uma balada lotada e pulsante, rindo, com o braço em volta da cintura de Emiliano. A cabeça dele estava jogada para trás, um sorriso largo e genuíno em seu rosto. O mesmo sorriso que ele não me dava há semanas.

"Na Pulse, galera! Melhor noite de todas!", dizia a legenda de Keisha.

Pulse. Não o estúdio. Ele tinha mentido. Ele estava com ela.

Meus ouvidos zumbiam, um chiado agudo que era ao mesmo tempo novo e aterrorizante. Era o som da traição, amplificado. Meu corpo parecia pesado, enraizado no lugar, mas minha mente era um turbilhão de gelo e fogo. Eu tinha que ver. Eu tinha que saber.

Peguei um táxi, as luzes da cidade um borrão do lado de fora da janela. O grave da Pulse vibrava através do asfalto, através dos meus sapatos, subindo até meu peito. Passei pelos seguranças, meus olhos varrendo a multidão pulsante. E então eu os vi.

Emiliano, sob as luzes estroboscópicas, com o braço em volta de Keisha. Ele estava rindo, a cabeça inclinada perto da dela. Um som feio e cru arranhou minha garganta. Não foi um grito. Foi um gemido, perdido na música ensurdecedora.

Eu fiquei ali, congelada, meu corpo um bloco de gelo no calor úmido da balada. Minha cabeça latejava, e a audição recém-retornada no meu ouvido esquerdo captava cada batida agonizante da música. E então, vozes.

"Olha o Emiliano, finalmente se divertindo um pouco", um de seus colegas de banda arrastou as palavras, cutucando outro cara. "O 'anjo surdo' estava ficando um pouco demais, não era?"

"É", o outro respondeu, tomando um gole de sua garrafa. "Oito anos. É muito tempo para bancar o enfermeiro. Além disso, a Adell sempre foi tão... quieta. Sabe, sem graça. A Keisha tem fogo. Exatamente o que ele precisa para continuar fazendo sucesso."

Meu coração martelava contra minhas costelas. Não eram apenas eles. A voz de Emiliano, clara como um sino, alcançou meus ouvidos. "Honestamente, ela se tornou... um fardo. Toda aquela coisa de 'meu herói', a gratidão constante. É desgastante." Ele riu, um som amargo e desdenhoso que me rasgou por dentro. "E o sexo? Como fazer um favor para um caso de caridade. Prefiro alguém que possa gritar meu nome, não apenas sinalizá-lo." Ele apertou a cintura de Keisha, e ela riu, pressionando o rosto em seu ombro.

A ironia daquela declaração me atingiu como um golpe físico. O mesmo ouvido de que ele falava, aquele que eu danifiquei para protegê-lo, agora era perfeitamente capaz de ouvir cada palavra cruel. O rugido em minha cabeça se intensificou, um peso esmagador contra meus tímpanos.

"Quer dizer, eu ainda me sinto na obrigação, sabe?", ele continuou, sua voz tingida de irritação. "Depois de tudo. O acidente. Toda a narrativa de 'ela salvou minha vida'. Não posso simplesmente largá-la. Ainda não. O casamento ainda está de pé, de fachada. Mas isso... isso é liberdade." Ele gesticulou vagamente para Keisha, seus olhos cheios de uma luz faminta que fez meu estômago revirar.

Minhas mãos se fecharam, as unhas cravando em minhas palmas. A taça de champanhe em uma mesa próxima, esquecida por seu dono, parecia zombar de mim. Era frágil, elegante, cheia de bolhas comemorativas. E então, sem pensar, eu a peguei. Meu braço balançou, impulsionado por uma força que eu não reconheci. A taça voou pelo ar, brilhando sob as luzes estroboscópicas, e se estilhaçou contra a parede logo acima da cabeça de Emiliano, o som engolido pela batida do baixo, mas o spray de líquido o fez recuar.

Ele se virou, seus olhos arregalados, a confusão se transformando em reconhecimento.

"Adell?", ele articulou, seu rosto empalidecendo.

Ponto de Vista de Adell:

Uma onda de náusea me invadiu, o choque de ver o rosto de Emiliano, pálido e horrorizado, quase insuportável. Lágrimas, quentes e incontroláveis, escorriam pelo meu rosto. Meu corpo se contorcia em soluços silenciosos. A música da balada, antes uma batida surda, agora parecia zombar do meu coração partido.

Emiliano, recuperando-se da surpresa, estendeu a mão para mim. Suas mãos, aquelas que uma vez sinalizaram tão ternamente promessas de eternidade, agora se moviam com uma urgência quase frenética. Ele formou os sinais familiares: "Adell, amor, o que você está fazendo aqui? Vamos para casa. Precisamos conversar."

Ele tentou me puxar, seu aperto firme no meu braço. Ele queria me arrastar para fora da balada, longe dos olhares curiosos e da música alta, para controlar a narrativa, para conter o desastre. Eu sabia. Aquele olhar em seus olhos não era preocupação por mim; era pânico por si mesmo.

Mas Keisha, mais ousada e possessiva do que eu esperava, se interpôs entre nós. Seus olhos, estreitos e frios, perfuraram minha vulnerabilidade crua. "Deixa ela em paz, Emiliano! Ela é sempre tão dramática. Não vê que ela está tentando estragar nossa noite?" Ela se agarrou ao braço dele, seu corpo uma barreira desafiadora.

"Não ceda a ela, Emi! Ela é patética, se agarrando a você assim", cuspiu Keisha, sua voz pingando veneno. "Sempre a vítima. Sempre precisando de você para fazê-la se sentir especial. Você merece alguém divertido, alguém que não seja sempre tão... cuidadosa."

Emiliano hesitou, seu olhar alternando entre nós. Ele não me defendeu. Ele nem mesmo tentou. Seu silêncio foi mais alto do que qualquer acusação. Minha visão turvou.

"Ela sempre foi a quietinha", Emiliano ponderou, quase para si mesmo, embora as palavras tenham chegado aos meus ouvidos com uma clareza brutal. "Sempre tão frágil. Tão facilmente quebrável. Ficou... sufocante." Ele olhou para Keisha, um sorriso fraco, quase de desculpas, em seus lábios. "Ela acha que me controla com sua impotência."

Ele realmente acreditava nisso. Ele acreditava que poderia me manipular, que meu amor era tão absoluto que eu perdoaria qualquer coisa. Sua arrogância doeu mais do que qualquer golpe físico.

Minha respiração falhou. Uma calma estranha começou a se instalar sobre mim, uma determinação arrepiante se solidificando no caos. O zumbido em meus ouvidos finalmente diminuiu, substituído por uma clareza silenciosa e determinada. Puxei meu braço do aperto de Emiliano, o movimento brusco e decisivo.

"Estou indo embora", sinalizei, meus dedos tremendo levemente, mas meu olhar inabalável. "E não vou voltar." Minha voz, embora fraca, estava firme.

Virei-me e abri caminho pela multidão de corpos, as luzes pulsantes e a música ensurdecedora um cenário surreal para o meu terremoto interno. Saí da balada, sem olhar para trás. O ar fresco da noite atingiu meu rosto, um choque bem-vindo após o calor sufocante lá dentro.

Chamei o primeiro táxi vazio que vi. "Para o aeroporto", eu disse, minha voz rouca. Minha mente disparou. As palavras de minha mãe ecoaram: "Se você algum dia perceber que cometeu um erro, sempre pode voltar para casa, Adell. Mas entenda, haverá condições." Sua condição sempre girava em torno do meu futuro, das minhas escolhas. Ela havia me alertado sobre a codependência, sobre me perder em outra pessoa. Ela queria arranjar um casamento para mim, um partido estável e rico. Eu zombei na época. Agora, a ideia não parecia tão terrível.

Senti uma pontada de arrependimento pela minha teimosia passada, por descartar sua sabedoria como um cálculo frio. Ela não era fria; ela era protetora. Ela tinha previsto isso.

O táxi acelerou pela cidade. Peguei meu celular, meus dedos ainda trêmulos, mas decididos. Abri meus contatos e encontrei o número da minha mãe. Fazia anos que eu não ligava diretamente para ela. Eu precisava dela. Eu precisava de sua força pragmática, de sua crença inabalável na estratégia.

"Mãe", eu disse, minha voz quebrando apenas um pouco. "É a Adell. Eu preciso de você. E... minha audição, ela voltou. Nos dois ouvidos." O retorno milagroso da minha audição, a única coisa positiva a emergir deste pesadelo, parecia um presente cruel, permitindo-me ouvir cada sílaba de sua traição.

"Eu aceito sua oferta", continuei, o alívio me inundando ao ouvir sua respiração ofegante do outro lado. "A apresentação arranjada. Eu me casarei com quem você escolher, desde que não seja ele. Eu quero construir uma vida real, uma vida construída no respeito, não em uma mentira."

Limpei os últimos vestígios de lágrimas das minhas bochechas, meu olhar fixo nas luzes da cidade que se distanciavam. A dor ainda era uma ferida aberta, mas por baixo dela, uma pequena faísca de resiliência tremeluzia. Eu cansei de ser a musa silenciosa e paciente. Eu cansei de ser Adell, a noiva surda. Eu era Adell Salles, e estava voltando para casa.

A decisão parecia uma extração dolorosa e excruciante, mas também como se eu estivesse me livrando de uma pele pesada e sufocante. Oito anos. Oito anos da minha vida, do meu amor, da minha audição, derramados em um homem que me via como um fardo, um caso de caridade. O peso dessa constatação se abateu sobre mim, pesado e frio. Mas com ele veio uma sensação estranha e estimulante de liberdade. A estrada à frente era incerta, mas pela primeira vez em muito tempo, era minha para escolher.

Meus dedos voaram pela tela, uma mensagem se formando para Emiliano. "Acabou. Não entre em contato comigo de novo."

Ponto de Vista de Emiliano:

O ar no loft estava pesado com o cheiro de champanhe velho e arrependimento. Minha cabeça latejava, uma batida implacável contra meu crânio, ecoando o caos da noite passada. Passei a noite ligando freneticamente para Adell, deixando mensagens de voz cada vez mais desesperadas, cada uma mais patética que a anterior. Mas o celular dela ia direto para a caixa postal. Nenhuma resposta. Nada.

Peguei a garrafa de uísque pela metade, despejando uma quantidade generosa em um copo. Keisha ainda estava dormindo na minha cama, alheia à tempestade que se formava em minha mente. A presença dela parecia... errada, uma nota dissonante na sinfonia da minha vida. Isso não deveria ter acontecido. Adell não deveria estar lá. Ela não deveria ter ouvido.

Meu celular vibrou. Uma mensagem de texto. Meu coração deu um salto. Adell.

Era curta, direta e devastadora. "Acabou. Não entre em contato comigo de novo."

Minha mão tremeu, o celular quase escorregando do meu aperto. "Não. Não, não pode ser." Fiquei olhando para a tela, lendo e relendo as palavras, como se elas fossem mudar, como se fossem magicamente se transformar de volta em uma declaração de amor. Mas elas permaneceram, cruas e implacáveis.

Um grito agudo, quase animalesco, rasgou minha garganta. Joguei o celular contra a parede, vendo-o se estilhaçar em cem pedaços. O impacto mal registrou. Minha mente estava em parafuso. Acabou? Como poderia ter acabado? Oito anos. Oito anos da minha vida, da vida dela. Minha carreira. Meu tudo.

Lembrei-me dos primeiros dias, do estúdio apertado, das noites intermináveis movidas a café barato e grandes sonhos. Adell esteve lá em tudo. Minha rocha. Minha musa. Meu... fardo. Aquela palavra, a que eu pronunciei tão descuidadamente na noite passada, agora ecoava em meus ouvidos, um julgamento cruel.

Ela me empurrou para longe daquele amplificador caindo, o metal quente queimando seu ouvido, roubando-lhe a audição. "Minha garota corajosa", eu a chamei. "Eu te devo tudo." E eu quis dizer isso. Juro que sim. Mas com o tempo, a gratidão azedou em ressentimento. Sua força silenciosa, seu apoio inabalável, pareciam uma dívida que eu nunca poderia pagar. Um lembrete constante do que eu devia a ela. Do que eu havia sacrificado.

Bati com o punho na bancada de mármore, a dor uma distração bem-vinda da agonia em meu peito. "Droga, Adell!", gritei para o apartamento vazio. "Como você pôde simplesmente... ir embora?"

Mas ela não tinha simplesmente ido embora. Eu a empurrei para longe. Eu a quebrei. E agora, eu a perdi. A constatação me atingiu com a força de um tsunami. Ela se foi. E eu não tinha ninguém para culpar a não ser a mim mesmo. O uísque queimou minha garganta, mas não conseguiu anestesiar o medo frio e desesperado que tomava conta da minha alma.

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