Pecadora
olta como normalmente eu não era. Eu sempre tinha sido tímida e quieta; ela, extrovertida e espalhafatosa. - Vocêri?-Elameempurroucomoombro, pressionando-me contra a parede. Empu
ei com ela. - É a nossa religião! - Pode ser a sua; a minha, não! Mordi os lábios, nervosa. Eram dois lados radicais, dois extremos. As brigas não eram novidade, mas agora Rebeca tinha ido longe demais. Nossos pais nunca aceitariam aquilo. Seria uma afronta sem perdão. - Rebeca, você não sabe mesmo quem é o pai do bebê? - Segurei a mão dela. - Podemos falar com ele. Talvez queira se casar, e aí contamos ao papai e... - Acho que até sei quem é, mas quem disse que quero me casar? Sair de uma prisão e cair em outra? Vou criar meu filho sozinha. Estou vendo um quarto para alugar. Aí pego minhas coisas, conto aos velhos e me mando. Simples assim. - Ter um bebê não é algo simples. Como vai trabalhar e cuidar dele sozinha, longe daqui? - Dou um jeito. - Ela sorriu e cruzou as pernas nuas. Usava um pijama de short e camiseta, outra afronta, já que nossos pais não permitiam roupas que expusessem o corpo. Aproximou-se, beijou minha bochecha e disse, tranquila: - Não se preocupe comigo. Vou ser mais feliz longe deste inferno aqui. Não sorri nem me despreocupei. Ruth – nossa irmã mais velha, de vinte e dois anos –, Rebeca e eu aprendemos cedo a viver de acordo com a religião dos nossos pais. Meu pai havia começado como obreiro de uma igreja pentecostal no interior do Rio de Janeiro, mas discordava de muitas das ideias que ouvia ali. Mudamos para uma vila no Catete, bairro de classe média da capital, e ele não se adaptou a nenhuma das igrejas que frequentou. Como era muito severo, achava quase todas liberais demais, mesmo aquelas tidas como mais rigorosas. Acabou fundando a sua própria igreja em uma casa alugada perto da nossa, dando-lhe o nome de Deus É Por Nós. Lá ele se tornou pastor e assumiu todas as responsabilidades que o cargo acarretava, realizando obras para ajudar a comunidade. Sua base foram a Bíblia e os fundamentos pentecostais de sua formação, mas ele moldou a nova religião de acordo com o que acreditava e nos educou com base nela. Rebeca, no entanto, sempre demonstrou pensar diferente. Meus pais a acusavam de ter sido corrompida pela devassidão, deixando o demônio ditar seus passos. No entanto, apesar das brigas, dos enfrentamentos mais e mais ousados dela, acreditavam poder salvá-la. Rebeca os acusava de nos oprimirem com ideias arcaicas, e a cada regra que nos era imposta minha irmã se rev