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Tempo de mudanças

Tempo de mudanças

Ana C Dutra

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Capítulo

Um executivo carrancudo faz Ana recomeçar sua vida após uma discussão que culminou em sua demissão, muitas mudanças à vista, ela tem que lidar com problemas pessoais e buscar novos ares, enquanto o amor finalmente bate a sua porte de uma forma totalmente inesperada e indesejada, será que ela consegue superar seus problemas e o rancor que guarda da pessoa pela qual se apaixonou?

Capítulo 1 O tempo virou

A chuva batendo no telhado, copiosamente, desde que se lembrava, não tinha visto o sol, nem de relance o mês todo, já estava acabando novembro, teoricamente a primavera daria lugar a um verão ensolarado no Natal no Hemisfério Sul.

Desde pequena, sua cidade natal era famosa pelas longas temporadas de chuva, tinha ótimas lembranças de banhos de chuva no verão, também de ficar sentada na janela observando a chuva lavar tudo pelo caminho, não importava quantos dias já se passavam chovendo, sempre vinha uma tormenta mais forte e sempre havia o que carregar, nasceu em uma casa no alto de uma colina.

Depois de alguns anos, mudou-se de cidade e descobriu que a chuva não era rotina em outros lugares, sentiu falta da umidade, logo retornou e a chuva novamente fez parte de sua rotina, tão certo como viver numa nuvem, os dias de sol, por serem mais escassos, eram aproveitados de forma plena, era como se quando a chuva dava trégua tudo parecia mais sublime.

Naquele dia, contudo, já adulta, não reparava mais no tempo, sol ou chuva, eram parte da rotina, na verdade a chuva a tornava resmungona, sempre que podia, dava uma volta em alguma cidade para ver um pouco mais de sol, principalmente na casa dos pais que ficava no litoral. Levantou-se com o barulho com que acordou da água transbordando da calha e respingando em algum objeto no chão.

Aquele barulho a deixava inquieta, alguma coisa dentro dela ficava a flor da pele, algo estava errado, desceu as escadas e deu comida aos cachorros, tinha dois companheiros de guarda fiéis, sempre felizes independente do tempo, da hora ou do humor da dona.

Foi depois então ver o que estava fazendo barulho na sua janela, como temia, um balcão com seus vasos de flores foi derrubado. Imediatamente fez uma varredura, patas de lama em todos os lugares na garagem.

Ao que parece os dois monstrinhos caninos se mantiveram ocupados por toda a noite, o barulho que ouviu a noite não foi um trovão ao final, eram os monstrinhos derrubando o balcão, e o barulho que seguia a calha era água batendo nos vasos caídos.

Ótima maneira de começar um dia, mal passava das 7 da manhã, pegou um balde, vassoura e pano, ia se atrasar para o trabalho, mas não ia deixar que os dois monstrinhos fizessem mais bagunça e também precisava tentar salvar suas flores, juntando o pouco que sobrou de terra do chão.

Passava das oito e meia quando finalmente chegou ao escritório, seus colegas, na verdade sua equipe de trabalho nem comentaram seu atraso, ultimamente não conseguia chegar no horário, péssimo exemplo para gerente.

Ao que parecia chegar às oito da manhã era uma missão impossível, também não cobrava pontualidade de ninguém, tinha em mente que a produtividade vinha em primeiro lugar, quer chegar às dez da manhã e sair às cinco da tarde? Tudo bem, desde que no decorrer do dia se trabalhe com excelência e se produza acima dos colegas.

Todos admiravam e gostavam de sua maneira de gerir, também tinha aqueles que reclamavam, principalmente por que seguiam estritamente as regras, mas produziam pouco, não gostavam de serem cobrados, entrar na hora e sair na hora era tudo que eles achavam ser suficiente para a empresa.

Mesmo como gerente nunca tinha demitido ninguém, pelo menos não diretamente, buscava remanejar alguém que não se encaixava na equipe, trocando funcionário com outro setor, por isso sua equipe era cobrada constantemente e ela se via na obrigação de passar a situação real para todos, sem passar a mão na cabeça de ninguém.

Naquele dia, tudo parecia conspirar para dar errado, além de chegar atrasada, acabou esquecendo de ir para um reunião na parte da tarde, ficou tão atarefada a manhã toda que não foi almoçar, então no meio da tarde resolveu comer um lanche como ultimamente sempre fazia, um horário de almoço num intervalo curto.

Quando já estava sentada na cafeteria esperando seu pedido ficar pronto, recebe uma mensagem do chefe: “onde você está?”, respondeu depressa: “cafeteria, almoço”, recebeu em resposta: "esqueceu a reunião as 15:30?”, em seguida: “estamos esperando você".

“Que dia”, pensou, respondeu que retornaria imediatamente, pediu para a atendente embalar o pedido para viagem e saiu correndo pela rua com seu guarda chuva laranja, não era mais do que dois quarteirões, mas não queria dar mais mancada de fazer o chefe esperar ainda mais para iniciar a reunião.

Entrou na sala totalmente envergonhada, com as bochechas vermelhas pelo exercício, o pacote de sanduíche e o guarda chuva em uma das mãos o celular e o suco na outra, não tinha o costume de ir fazer lanche com bolsa, levava apenas seu cartão de crédito no bolso da calça.

Com toda a bagunça em casa pela manhã, não teve tempo de passar uma roupa social, estava com calça jeans e blusa, um colar de bijuteria e o cabelo amarrado em rabo de cavalo, mais simples impossível, como era jovem, não era difícil ser confundida com alguma estagiária de vez em quando o que era muito lisonjeiro e até melhorava seu dia.

Contudo, naquela tarde, gostaria de ter perdido mais do que 10 minutos se arrumando, a reunião estava no calendário mensal da empresa, mancada total ter esquecido, totalmente sem desculpas, mas desta vez, gerentes de todas as unidades daquela filial na região estavam presentes, inclusive gerentes de filiais superiores e também o tão temido Ceo da Empresa, Dr. Juliano Ruiz, estava presente.

Sua unidade apesar de pequena era estratégica, ótima com produção, dava suporte e cumpria determinações de outras unidades, como atividade complementar ajudava também a logística, recursos humanos, financeiro e manutenção da empresa.

Por esse motivo sua presença era essencial na reunião, deixar todo mundo esperando era totalmente constrangedor e se apresentar daquela forma, com seu quase almoço era ainda mais, ela ia deixar os monstrinhos de castigo, mas lembrou-se que ultimamente andava distraída e atrasada, portanto se não fosse a bagunça deles, teria outro motivo para estar atrasada.

O gerente da unidade a apresentou a todos formalmente, já conhecia a maioria por telefone, email ou até mesmo pessoalmente em visitas às outras unidades, ela era muito conhecida e todos reconheciam seu excelente trabalho, pelo menos isso a deixou mais confortável, contudo não havia apenas figurinhas repetidas, na sala havia uma turma de três figurões, destoavam dos demais pelos trajes impecáveis, alta diretoria da matriz.

“Ok, o importante era não cometer outra gafe”, pensou, então seu gerente passou ao Juliano, que começou mostrando alguns relatórios, todos receberam cópias, depois começou a falar uma palavra que deixou todos atônitos: cortes de pessoal.

Seu estômago se revolveu, a fome estava criando um buraco negro no seu estômago, consumindo tudo que tinha, inclusive a barra de cereal que tinha consumido antes do meio dia, aquela palavra conseguiu fazer o pouco que havia lá dentro e a deixar enjoada. Prestou muita atenção nos números e em toda a explanação, então o gerente da unidade voltou a falar, agora dando as diretrizes, que partes de cada filial haveria redução.

Já havia se adiantado lendo o relatório de forma dinâmica, pulando todo texto explicativo e indo direto aos números esperados, algumas unidades seriam fundidas e seus funcionários temporariamente remanejados.

Um plano de demissão voluntária e também um processo seletivo de remoção interna seria aberto. Depois do prazo iniciariam as demissões e os fechamentos, ela já esperava a longo prazo um encolhimento nas operações físicas, até porque com a internet sendo cada vez mais presente, os clientes demandavam que as operações passassem à era virtual.

Ela estava até certo ponto se preparando para isso, buscava constantemente modernizar seus processos de trabalho para tornar tudo mais integrado e rápido de executar, mas foi pega de surpresa quando leu no relatório que sua equipe de dez pessoas ficaria reduzida em cinco num intervalo de noventa dias, sendo que na verdade duas pessoas iriam vir de duas outras filiais, então das cinco apenas três seriam da atual equipe.

Sim, havia pessoas não tão produtivas, mas mandá-las para casa parecia um crime que ela não queria cometer, muito menos quando o relatório todo parecia invenção de um diretor que em 10 anos era a primeira vez que pisava naquela unidade.

Havia dados insólitos, projeções de demanda e a produtividade geral estavam fora da realidade. Infelizmente, por não estar preparada para a reunião não havia trazido seu notebook, tinha um relatório preparado para a reunião mensal, acabou esquecendo que era naquele dia, mas o relatório estava pronto, também possuía projeções mensais e anuais, de pelos menos os últimos cinco anos para corroborar seus dados.

Ao final o gerente da unidade abriu para os presentes darem seus pareceres, muitos dos chefes de unidades estavam acovardados, temendo por seus cargos, outros apenas digerindo tudo que havia sido dito.

Ela pediu a palavra e falou o que acreditava, não se importando com seu cargo, criticou a redução drástica imediata, concordou que a longo prazo havia uma tendência de redução, mas essa redução imediata traria apenas prejuízos à empresa, muitos processos hoje envolvidos seriam prejudicados, a produtividade, o descontentamento, a total falta de tranquilidade ia gerar uma instabilidade geral.

Percebeu Dr. Juliano dar uma risada irônica com suas palavras, ao final, impulsiva que era, explicou que se a empresa seguisse naquela direção não via outra saída que não fosse se voluntariar à demissão, pois não consideraria correto demitir a maior parte da sua equipe e ficar apenas para juntar as peças.

Recebeu uma resposta imediata: "se essa é a visão da senhorita, considere o pedido de demissão aceito", ele olhou aos demais e reforçou o mesmo a eles, se não se sentissem confortáveis com a nova diretiva da empresa, poderiam também deixar o quadro.

Como um total deboche ainda agradeceu a iniciativa dela de pedir demissão e que era de fato um exemplo a ser seguido, já que seus interesses não estavam alinhados com a direção, era coerente que ela buscasse uma empresa que atendesse seus objetivos.

Ela saiu imediatamente da sala, sem cerimônia, afinal, estava demitida, apenas para cumprir trinta dias contratuais de aviso prévio. Voltou à sua sala vermelha da cabeça aos pés, saiu tão atordoada da sala de conferência que esqueceu seu almoço lá mesmo.

Os colegas perguntaram o que havia ocorrido, ela não teve coragem de naquele momento expor, também já não cabia a ela contar a grande notícia, a maior parte deles em breve compartilharia de sua raiva e frustração, mas resolveu que não seria ela que faria isso com eles.

Deu uma desculpa qualquer, informou que terminaria seu expediente mais cedo, devido a não estar se sentido bem. Pegou seu guarda-chuva e foi até o carro, sentou-se e chorou por uns 30 minutos, o para-brisa estava borrado pela chuva e suas lágrimas.

Começou na empresa ainda na faculdade como estagiária, aos poucos foi ganhando terreno, efetivou-se, primeiro emprego, formou-se, nunca tinha trabalhado em outro lugar, era a melhor no que fazia na empresa, todos a conheciam pelo seu trabalho excelente e pela sua rapidez na execução.

Nunca tinha sequer buscado outro emprego, nem sabia por onde começar naquela altura da vida. O que faria se não encontrasse outro emprego? Isso era apenas sua angústia, que logo seria um coro de duzentos funcionários demitidos em noventa dias.

Buscava não se exasperar, ao menos não tinha uma família para sustentar, era sozinha, e se precisasse de verdade podia contar com ajuda dos pais.

Mas o choro ficou ainda mais forte quando pensou nas pessoas que não teriam a mesma facilidade, as famílias que dependiam daquela empresa, pensou no quão fácil era para aquele homem vir de tão longe, imprimir um relatório insólito e apresentar uma solução para todos os problemas da empresa, aquele homem era um monstro com seu sorriso debochado.

A raiva substituiu o desespero, aos poucos as lágrimas eram de ódio daquele ser maligno. Até que seu coração se abrandou, começou a bolar um plano em sua cabeça, enxugou suas lágrimas e deu a partida no seu SUV automático, que recém tinha comprado e estava pagando um financiamento caro.

Mais lágrimas chegaram aos olhos quando pensou que talvez tivesse que se desfazer de seu carro, antes de pedir dinheiro aos pais, ia vender o carro, se necessário, ela amava seu carro, adorava dirigir, principalmente aquele SUV se sentia uma madame, não que fosse fútil, mas gostava de se mimar as vezes.

Foi para casa, seus cachorros, monstrinhos que destruíram seu jardim suspenso pela manhã, agora tratavam de tranquilizar a dona, enquanto isso, ela foi terminar de arrumar seus vasos, pensou que o primeiro a fazer era acertar as coisas, nenhum pequeno detalhe deveria ser deixado de lado.

Depois tomou um banho, foi para seu notebook e correu algumas páginas de emprego, atualizou seu currículo, aquele mesmo de quando pedia a vaga de estágio, agora colocando a infinidade de cursos de especialização, pós e mestrado que havia realizado ao longo dos anos, sempre foi uma aluna exemplar e estudar era um prazer secreto.

Após acabar a faculdade de engenharia, tinha feito outras duas graduações, todas à distância, pois não podia dispor de horas fixas semanais para estudar, tinha muita facilidade com computadores, raciocínio lógico, rapidez no pensamento. Era calculista e muito perspicaz, era difícil enganá-la, fazia um pré-julgamento das coisas, situações e pessoas muito assertivo.

E era bem por isso que estava sozinha, não conseguia se prender a ninguém, às vezes engatava relacionamento com algum cara, mas eram relacionamentos curtos, acreditar no cara era seu pior defeito, ela esquecia todos os alertas mentais, toda a lógica nas primeiras semanas, e quando via toda a lógica e realidade caía como uma pedra na sua cabeça.

Ultimamente havia desistido disso, quase uma vida de celibato, o trabalho bastava para consumir seu tempo e lhe dar prazer, o resto ela passava estudando, lendo ou conversando com as amigas e seus pais.

Naquela noite, sentiu falta de ter alguém para desabafar, mandou mensagem para algumas amigas, mas todas estavam ocupadas, seus pais estavam longe, não queria mesmo preocupá-los de imediato com seus problemas.

Pegou seu carro e foi até a casa do irmão que ficava do outro lado da cidade, ela morava num bairro mais agitado, em uma casa que herdou antecipadamente dos pais, quando eles foram morar no litoral, já o irmão morava num bairro muito mais calmo, tinha dois filhos, um recém- nascido e outra a sua paixão estava com três anos.

Foi recebida pela sobrinha que correu para seu colo para ganhar um abraço, era sempre uma delícia, esquecer os problemas e poder rastejar duas horas com as bonecas, carrinhos, até a dor gostosa de pisar em uma daquelas peças de montar espalhadas pelo chão da casa, geralmente ia embora antes da pequena cair no sono.

Naquele dia porém, depois que a sobrinha acabou dormindo no sofá enquanto assistia um musical, ela aproveitou para conversar com o irmão e a cunhada que estava amamentando o pequenino, era uma cena muito terna, os dois sentados ela passando a mão na cabecinha quase sem cabelo do bebezinho que estava agarrado ao peito da mãe e sua mãozinha juntinha da mãe.

Um aperto forte no coração, não quis estragar aquela paz, seria um crime jogar seus problemas e negatividade naquela família tão feliz. Se despediu, e indo ao carro viu que uma das amigas respondeu sua mensagem, estava a convidando à ir um pub novo na cidade.

Ela estava com uma roupa péssima para um barzinho, mas decidiu ir mesmo assim, afinal sua intenção seria apenas conseguir desabafar com a amiga e ir embora, tinha muita coisa para fazer no dia seguinte, teria que começar de verdade a fazer algo por sua vida.

Quando saiu do carro para o manobrista estacionar já se arrependeu, duas mulheres produzidas passaram por ela e deram um olhar de desprezo, a roupa era confortável mas brega, ela sabia. Não era feia, recém-chegada à turma dos trinta, era de estatura mediana e com peso dentro do aceitável, uma gordinha sexy.

Tirou pelo menos o casaco que usava, ficou apenas de regata, era final de novembro, já não estava frio, mas a chuva não deixava o clima mais ameno. Uma coisa que a deixava bem era que tirando as duas do esquadrão da moda, as pessoas no pub pouco se importavam com a roupa que ela estava vestindo, exceto é claro sua amiga que a esperava junto ao bar.

A primeira coisa que a amiga disse foi criticar a roupa que ela estava vestindo. Ela tratou logo de explicar, contando toda a tragédia do dia, a amiga de faculdade, apesar de ser engenheira também, trabalhava numa loja de móveis e desenhava ambientes, acabou virando arquiteta. Era muito requintada e tinha um conceito de moda impecável, a única que tinha autorização para falar mal da sua roupa.

Nunca tinha visto a amiga com algo de gosto duvidoso, nem seus namorados, que sempre pareciam ter saído de alguma capa de revista, pena que a amiga não socializava esses bofes, ela também já tinha desistido de sair com algum amigo deles, pois os caras em geral eram muito mais preocupados com academia e alimentação saudável, o que não era nenhum defeito, mas era o avesso do estilo de vida dela.

Os encontros arranjados também eram sempre um desastre, ela já tinha decidido que o próximo cara ia ser um encontro casual e definitivamente alguém com gostos compatíveis aos dela. A amiga não perdia mais tempo apresentando ninguém.

Diana, sua amiga além de modelo era arquiteta, estava essa noite impecável num macacão azul marinho, em decote V, nada muito vulgar ou provocativo, sexy sem ser vulgar, ela por outro lado vestia uma calça jeans completando o look com regata folgada estampada de um seriado de TV e um Louboutin preto que tinha comprado em um brechó na última viajem à Nova York.

O sapato conseguia dar ao menos um ar sexy, prendeu seu cabelo num coque meio solto e passou alguma maquiagem no carro, não estava de todo ruim, para o gosto dela.

Passou todo o serviço para amiga de uma vez, estava engasgada com toda a frustração e raiva do dia, amiga boa é aquela que xinga e chora junto, essa era a Diana, ficou chocada com a notícia da demissão, mas tratou logo de soltar o verbo para o carrasco.

Um cara veio puxar assunto com a amiga, olhou de relance para ela, leu sua camiseta e riu um bocado, era a série favorita dele também, engatou conversa por alguns momentos, mas não estava no clima romance, trocaram telefones e ela seguiu desabafando com a amiga.

Preferiu não beber, pois estava dirigindo, depois de exaurir todo seu vocabulário de xingamentos para o ex-chefe, seguiu para casa disposta a abrir uma boa garrafa de vinho, a amiga lhe tinha ajudado expandir sua mente para novas oportunidades, deu várias ideias úteis.

Acordou, o dia anterior parecia um pesadelo distante, abriu os olhos e algo estranho estava batendo em sua janela: o sol, ficou um tempinho parada olhando os raios de sol na sua cortina, onde o sol tímido se levantava, por entre os prédios e vegetação que circundavam sua casa.

Não demorou muito uma nuvem invejosa o cobriu, ele voltou a ser fruto da imaginação dos moradores daquela cidade, que o simples fato do sol sair já era motivo para todas as conversas naquela manhã serem sobre ele.

Chegou ao trabalho determinada a iniciar seu procedimento de retirada da empresa, não tinha volta, sempre foi uma pessoa que cumpre com a palavra, orgulhosa jamais pediria desculpas, ainda que ela mesma tivesse errado, parecia imperdoável consigo mesma trair seus princípios.

Não se surpreendeu com o email recebido da diretoria:

Prezada Srta. Ana,

Agradecendo os esforços e dedicação destes últimos 10 anos, temos o pesar de comunicar que, devido à reestruturação em nossa empresa, seus serviços não serão mais necessários, fica notificada a partir do recebimento desta comunicação, que em trinta dias, V. Sra. deixará de compor o quadro de nossa empresa.

Exprimimos nossos votos de boa sorte em sua nova carreira e também estamos a disposição para oferecer uma carta de recomendação, devido ao alto padrão e dedicação nos serviços prestados nesta empresa.

Uma circular será enviada à sua unidade nesta data, pelo que solicitamos que seja assinada e entregue com aposição de ciência.

Desde já agradecemos sua colaboração na transição para nova chefia.

Ass. Diretoria. 30/11/xx

Foram rápidos, pensou, devem ter mesmo ficado incomodados com suas palavras, talvez com medo dela influenciar outras chefias e criar um motim, ela tratou de passar os dias seguintes reunindo relatórios e compilando dados, o novo chefe foi escolhido dentro de sua própria equipe pelo gerente, pelo menos uma decisão acertada, pensou.

Ela reuniu sua equipe pela tarde para informar que estava deixando a empresa, sem dar muitos detalhes, era muito ética para vazar informação confidencial, além do mais não era nada produtivo criar pânico, podia dentro de pouco tempo não mais participar daquela empresa, mas não cometeria um ato de impropriedade para macular seu currículo.

Quanto ao relatório recebido da diretoria na reunião do dia anterior, esperou para que o novo chefe fosse indicado e pediu autorização por email ao gerente para passar à ele, para que pudesse se preparar ao que iria vir.

O que para ela foi um choque e motivo de rebeldia, o colega recebeu de forma nervosa, mas muito diferente dela, tratou de já fazer uma lista com os nomes dos colegas que seriam eliminados da equipe, transpareceu após o primeiro choque, muita tranquilidade, e na reunião que se seguiu na presença do gerente, falava até com entusiasmo.

Ela gostava muito da pessoa que havia sido indicada para ocupar seu lugar, era um colega que sempre pode contar nos momentos de necessidade, mas aquela reação fez com que ele perdesse todo seu apreço, sua total falta de solidariedade com os colegas que seriam demitidos, sua aceitação, até sua empolgação a deixaram decepcionada.

Não era essa a reação que esperava das pessoas, depois de alguns dias ela colocou as coisas em perspectiva, o colega estava apenas tomando a situação pelo que ela era: inevitável, sete pessoas seriam demitidas, ele se demitindo como ela fez ou não, então, três pessoas ficariam e teriam que tocar o barco adiante.

Quando conseguiu raciocinar de forma imparcial sobre o tema, num breve momento, arrependeu-se da atitude impulsiva. Mas depois lembrou que jamais conseguiria vencer o desafio moral de garantir a própria pele e detrimento de outras pessoas, isso não estava na sua personalidade.

Já a atitude na reunião era típica dela, era tímida, mas, estar diante de uma situação de injustiça, fazia demonstrar com firmeza sua posição, sempre disposta a arcar com as consequências de seus atos, levou essa forma de agir em todos os aspectos da sua vida, era conhecida por amigos e família por ser franca e honesta.

As pessoas que não conhecem sua personalidade fazem um pré-julgamento e acabam por considerá-la antipática por ser muito objetiva, na verdade ela era um pouco arrogante mesmo, pois acredita estar certa e se permite passar por cima de convenções sociais ou até mesmo hierarquia para dizer o que pensa doa a quem doer.

Ela também não se esforça para que estranhos tenham uma boa opinião, justamente pensa que as pessoas merecem conquistar sua confiança para então ela mostrar seu lado doce e gentil, porque sim, ela tem esse lado também.

Por se um pouco tímida, ela abusava da altivez como forma de esconder sua personalidade, uma máscara para espantar pessoas superficiais e mal intencionadas, que podem tentar manipular seu coração mole.

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