Daily nasceu uma Kasenkina. Mas era curiosa, perspicaz e forte, querendo ir além do que as mulheres submissas e sem voz que representavam seu povo. Despertando o interesse do conselheiro do líder Kasenkino, Ahua, ela foi oferecida em casamento por seu próprio pai a um homem com idade para ser seu avô. Acreditando que nada poderia ficar ainda pior, apaixonou-se pelo homem mais proibido que poderia existir, uma pessoa do reino de Machia, que desde sempre foi o inimigo mortal de seu povo. Mas era nas noites, embrenhada no lado vetado da floresta, que ela tentava resistir e não conspirar contra seus próprios antepassados. Além de tentar lutar com todas as forças contra aquele sentimento, Daily ainda escondia de seu amado um grande segredo, o qual se soubesse ele jamais a perdoaria. Entre mitos, lenda, espíritos sagrados e segredos, Daily precisa ser forte e desvendar os mistérios sobre seu passado, o de seu próprio povo e tentar resistir à guerra que começava a ser travada, que poderia ser a mais mortal da história.
Há muitos e muitos séculos atrás, não se sabe exatamente em que tempo e muito menos o local em que se passou, viveu um povo lendário, guerreiro e místico. Até hoje as pessoas se arrepiam de medo ao ouvir o nome Kasenkinos.
Povo do bem... Talvez do mau... Tinham tanto o poder de salvar vidas como também de tirá-las. Eles só queriam viver isolados naquela forma de vida em que acreditavam, mas não eram entendidos pelos outros povos. Lutavam contra tudo e todos que se aproximavam deles, inclusive entre si.
Nas batalhas entre grandes líderes e onde os deuses e espíritos sagrados os conduziam, eles sempre eram corajosos e impiedosos. Veneravam ao extremo a beleza feminina, mas ainda assim não respeitavam as mulheres como pessoas inteligentes ou que pudessem tomar decisões ou opinar dentro do clã.
Um povo crente em mitos, lendas e espíritos passados... Perseguido eternamente pelo reino, que sonhava um dia capturar cada um dos Kasenkinos e talvez poder julgá-los por tudo que fizeram, como seres sagrados ou demônios que vivam na floresta.
Daily olhou novamente para o povoado. Todos caminhavam de um lado para outro, desnorteados. Ela não sabia o que estava acontecendo. Mas temia que fosse uma batalha. Correu até o ponto de encontro no rio, onde estava a maioria dos Kasenkinos. Ahau e Ahua estavam sobre a grande pedra que ficava metade na água, outra na terra. Assim que Ahau, líder Kasenkino levantou o braço, todos se calaram para ouvi-lo.
- Povo Kasenkino. – falou Ahau. – Recebi finalmente o aviso que tanto esperava. Os antigos espíritos dizem que está na hora da grande batalha. Vamos atacar o rei Pollo e todo o Reino de Machia. Esperamos muito por este momento e estamos preparados para vencer esta guerra. Quero que derramem todo sangue necessário... Matem todos. Têm minha permissão e a dos velhos espíritos para irem... Os deuses estarão do nosso lado.
Assim que Ahau abaixou o braço, todos os homens saíram correndo do povoado, pegando todas as armas que conseguiam.
Daily ficou ali, olhando para ele. Percebeu o olhar de Ahua sobre ela. Não era a primeira vez que tinha uma sensação ruim ao ser observada pelo feiticeiro Kasenkino. Um arrepio a fez sair do devaneio e parar de pensar naquele homem que a impressionada e lhe dava certo temor.
Ela saiu correndo dali para ver se conseguia maiores informações sobre o que realmente estava acontecendo ali. Por que aquele luta agora? Teria o rei de Machia feito alguma coisa aos Kasenkinos que ela não sabia? Nascera ouvindo que o Reino de Machia e o rei Pollo eram inimigos dos Kasenkinos, mas na prática nunca havia visto nada que provasse isso. Somente histórias de uma inimizade que perdurava por muitos e muitos anos, décadas e talvez até séculos. Às vezes pensava que os dois povos haviam nascido inimigos.
Daily pensou em Burt. Se havia guerra, o velho amigo ferreiro sabia o real motivo. Ela se dirigiu até lá. Adentrou no local onde ele produzia suas armas sem se anunciar.
- Daily, o que faz aqui? – perguntou Burt surpreso ao vê-la ali.
- Você sabe que está havendo uma guerra lá fora?
- Sim, eu sei. Há muitos dias que não durmo direito, trabalhando na produção das melhores lanças e espadas que já fiz na minha vida. Enfim acho que agora vou poder descansar um pouco.
- E você está assim, tranquilo com esta guerra? Por qual motivo lutarão contra o rei Pollo?
- Seu pai não lhe disse nada?
- Não... Nada ele acha que me diz respeito. – falou ela decepcionada pelo pai não ter comentado nada sobre a enorme batalha que estava sendo planejada.
- Mas isso não é segredo para ninguém... Estamos nos preparando para esta batalha há uma vida inteira.
- Afinal, Burt, para que esta guerra?
- Posse de território, briga por comida, ouro e tudo que você já sabe. Mas creio que o que levou a antecipar tudo foi o fato de que carnearam vários animais nas nossas terras... Eram nossos.
- Mas por que fariam isso? Eles não têm os próprios animais no reino?
- Talvez quisessem esta batalha mais que nós.
- Mas não há marcas e nada que delimite onde é território de quem, não é mesmo? Então como podem ter certeza de que foi no domínio das nossas terras?
- Daily, não entendo o porquê de tantos questionamentos... Por que você insiste nisso? Você acha que alguma mulher está se importando com as delimitações das terras ou o motivo desta batalha? Elas sequer sabem o que está acontecendo... Só ficam na espera para que seus maridos voltem da batalha. E apoiam nosso povo independente do que houve.
- Você sabe que eu não sou assim... Conhece-me a vida toda. Jamais aceitei coisas sem questionar.
- Sei disso... Você é diferente de todas. Só espero que não se prejudique com isso algum dia.
- Certamente meu pai estará liderando o povo na batalha... Há chances de ele voltar?
- Por que faz esta pergunta? Sabe que Erone é o melhor guerreiro Kasenkino que já existiu.
- Tenho tanto medo, Burt... Por meu pai, pelos Kasenkinos e pelo reino de Machia.
- Só uma pessoa pode lhe garantir se seu pai voltará ou não... E você sabe quem é.
- Moa. – afirmou ela.
- Exatamente. Vá até lá e ele poderá lhe dizer com exatidão o que o destino reserva para seu pai.
- Faz tanto tempo que não vou até lá... Ele pode estar magoado comigo.
- Não estará. Sabemos o quanto ele gosta de você e deve saber que não é culpa sua.
- Eu preciso ver Moa o mais rápido possível.
- Não irei com você. Vou descansar um pouco e preciso continuar a produção.
- Por que mais armas? Você não disse que está fazendo isso há dias?
- Tenho ordens de continuar produzindo... O máximo que puder.
- E acha que conseguirá fazer muitas?
- Se eu não fizer posso ser sacrificado não é mesmo? Então farei o meu melhor.
- Não podem fazer isso com você. É o único que produz armas no nosso povo... Deveriam venerá-lo e não ameaçá-lo.
- Você sabe que eles podem fazer qualquer coisa, Daily. E eu aceito a vontade do nosso líder e as decisões dele. Você sabe que ele cumpre as ordens dos antigos espíritos. Eu jamais ousaria desobedecer nossos antepassados sagrados. Não quero ser amaldiçoado de forma alguma. Prefiro a morte a ser um homem sem espírito.
Ela respirou fundo. Imaginava ouvir aquilo dele.
- É melhor se apressar para ver Moa. – falou ele.
- Estou indo imediatamente.
Daily correu seguindo o rio acima. Logo ficaria escuro e o caminho era longo. A mata havia crescido bastante naqueles lados da floresta e ela estava um pouco perdida. O longo vestido começava a rasgar pegando nos galhos cortantes. Ela já começava a sentir fome e por vezes esbarrava em poças que não havia como atravessar sem ser entrando dentro. Não parecia que aquele caminho era tão difícil. Fazia muito tempo que não visitava Moa. Seu pai não havia permitido e como sempre que ia até a casa dele brigavam muito ela decidiu obedecer, para que os dois pudessem conviver em harmonia.
Ela olhou para a lua cheia que iluminava a noite na mata escura e pediu:
- Grandes espíritos do passado... Deem-me força para não desistir e continuar minha jornada.
Depois de mais algum tempo caminhando entre a mata ela avistou no alto da colina a casa de Moa. Agora vinha a pior parte... A subida íngreme, que ardia os joelhos. Ela bateu com força na porta e demorou um pouco para Moa abri-la.
- Daily... O que faz aqui? – perguntou ele surpreso com a presença dela.
Ela ficou bastante impressionada com a aparência de seu velho amigo... Os anos não haviam sido muito generosos com ele. Parecia muito mais velho e tinha uma aparência frágil. Estava tão magro... Estaria doente? Ele vestia uma longa camisola branca, certamente preparado para dormir, sem esperar visitas no meio da noite.
- Moa... – ela abraçou-o com força. – Estou tão feliz de ver você... Quanta saudade eu senti.
- Nem lembro a última vez que nos vimos... Você cresceu tanto, minha pequena.
- A distância, a idade e meu pai nos separaram.
- Eu sei... Não precisa se explicar. Mas entre logo.
Ela sentou-se na velha cadeira que lhe era oferecida. Ele acendeu o fogo para que pudessem conversar melhor.
- Moa... Como eu precisava vê-lo.
- Eu sei o que deseja, Daily.
- Sabe? – perguntou ela confusa.
- Os velhos espíritos me falaram sobre você.
- E o que eles disseram, Moa?
- Calma, minha pequena menina. Nem acredito que se transformou numa mulher. – disse ele olhando calmamente para ela. – O tempo passou tão rápido assim? Eu acho que nem me dei conta.
Ela sorriu. Como gostava daquele homem. Rosto magro e um pouco enrugado pelo tempo... Dentes ainda brancos, lábios pequenos, nariz grande e um cabelo quase branco que ia até os ombros. Ela não se lembrava daqueles cabelos brancos... Realmente o tempo havia passado e eles nem haviam percebido. Mas a saudade que ela sentia dele era imensa.
- Seu pai voltará mais honrado do que já é. Ele é um dos melhores guerreiros que os Kasenkinos já conheceram.
- E... Os demais homens?
- Será uma batalha difícil para ambos os lados... Todos sairão perdendo.
- Moa, não entendo o porquê desta guerra sem fim contra o reino de Machia.
- Pois isso é só o começo.
- Como assim? Haverá mais guerras depois desta?
- Infelizmente você verá muitas batalhas, querida Daily. Seu futuro está cheio delas... Na verdade, o de todos nós.
- Eu não gostaria que fosse assim... Queria que tudo fosse diferente. Quantas vidas perdidas... Nunca tentaram conversar sobre isso? Por que Machia e os Kasenkinos se odeiam tanto?
- A boa notícia, minha menina, é que você carrega a paz.
- Eu? – perguntou ela confusa e surpresa.
- Eu sempre soube que você era especial, desde que nasceu. Mas fui avisado que é a portadora do fim da guerra entre o Reino de Machia e os Kasenkinos... E isso me deixou muito surpreso, mas ao mesmo tempo temeroso, pois sabemos que o fim desta guerra não deve ser nada fácil.
- Não pode ter ouvido certo dos espíritos, Moa. Eu não seria capaz disso.
- Os espíritos nunca mentiram, Daily.
-Eu sei... – disse ela envergonhada.
- Mas vamos esperar para ver o que está previsto para você.
- Estar perto de você é como estar com minha mãe. Tenho sentido muito a falta dela nos últimos tempos. Deve ser porque estivemos afastados.
- Sua mãe era uma mulher única.
- Fale-me sobre ela, Moa... Por favor. Você nunca viu o espírito dela? Por que nunca me contam nada sobre ela? Por que meu pai evita falar sobre isso? É como se ela nem tivesse existido.
- Você já está tão crescida... Seu pai já deveria ter tido esta conversa com você. Merece saber a verdade sobre Darla. Mas ele deve saber o que faz.
- Moa, somente você poderá me contar sobre minha mãe. Papai nem me deixa tocar neste assunto. E isso me consome por dentro, acredite.
Capítulo 1 Um
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Capítulo 2 Dois
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Capítulo 3 Três
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Capítulo 4 Quatro
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Capítulo 5 Cinco
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Capítulo 6 Seis
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Capítulo 7 Sete
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Capítulo 8 Oito
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Capítulo 9 Nove
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Capítulo 10 Dez
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Capítulo 11 Onze
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Capítulo 12 Doze
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Capítulo 13 Treze
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Capítulo 14 Quatorze
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Capítulo 15 Quinze
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Capítulo 16 Dezesseis
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Capítulo 17 Dezessete
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Capítulo 18 Dezoito
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Capítulo 19 Dezenove
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Capítulo 20 Vinte
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Capítulo 21 Vinte e um
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Capítulo 22 Vinte e Dois
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Capítulo 23 Vinte e Três
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Capítulo 24 Vinte e quatro
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Capítulo 25 Vinte e cinco
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Capítulo 26 Vinte e seis
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Capítulo 27 Vinte e sete
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Capítulo 28 Vinte e oito
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Capítulo 29 Vinte e nove
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Capítulo 30 Trinta
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Capítulo 31 Trinta e um
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Capítulo 32 Trinta e dois
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Capítulo 33 Trinta e três
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Capítulo 34 Trinta e quatro
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Capítulo 35 Trinta e cinco
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Capítulo 36 Trinta e seis
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