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Até Que O Inverno Acabe

Até Que O Inverno Acabe

Bela Blair

5.0
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139
Leituras
5
Capítulo

E se sua paixão nos tempos de escola fosse capaz de dominar seus traumas? Até Que o Inverno Acabe, conta a história de Lisa e Dylan. Ambos tiveram uma fase difícil na infância, mas Lisa Adams foi capaz de deixar para trás um passado doloroso enquanto Dylan, ainda carrega as marcas de uma vida injusta. Lisa Adams, uma mulher decidida e afetuosa, voltou para sua cidade sete anos depois, afim de esquecer o estresse da capital. Ela só não imaginou que suas pequenas férias pudessem ser cheias de descobertas familiares e que um homem seria capaz de despertar não só sua curiosidade, como também um sentimento mais profundo. Dylan Morris é tímido e reservado, mas muito atencioso. Dono de uma livraria e um típico faz tudo da cidade, ele nutre uma paixão por Lisa que nunca foi capaz de revelar. Com ela de volta e trabalhando em sua livraria, seus traumas do passado ficaram mais aflorados, deixando seu futuro cada vez mais indeciso. Será que Lisa conseguirá desatar os nós de Dylan? Como seu amor à sua frente, Dylan será capaz de superar os traumas que sempre colocaram em dúvida o seu futuro? Será que os dois serão capazes de encontrar um final feliz? “Você fez o inverno dentro de mim ser quente...”

Capítulo 1 UM

Eu caminhava pela estrada de terra, após uma longa viagem de carro. As diversas sensações que brotavam em mim, eram estranhas, porém boas. Arrastando minha mala preta de rodinhas, senti meu celular vibrar pela décima vez no bolso do longo casaco bege que eu usava. E pela décima vez ignorei a mensagem do meu chefe.

Coloquei o celular de volta no bolso e levantei minha cabeça vendo que o interior de Aspen, onde morei por alguns longos e difíceis anos da minha adolescência, não havia mudado muito. Movi meus pés continuando minha caminhada, até parar em uma casa de dois andares que reconheci ser do senhor Noah Stuart. Subi meus olhos vendo uma grande placa de madeira escrito à mão e vinquei levemente minha testa.

— Livraria Estrella? – indago surpresa. – Livros?

Recordo-me do nome Estrella. Era esposa do senhor Noah. Olhei em volta vendo poucas pessoas passarem por ali e segui de volta para a longa estrada de terra, arrastando minha mala enquanto observava o condado de Pitikin. A pista de patinação estava repleta de crianças, a neve de algumas noites passadas ainda estava intacta nas laterais da estrada. O sol da tardezinha, apesar de nos presentear com seu brilho, não conseguia esquentar o clima frio. Tirei da bolsa que carregava, um par de luvas de lã, colocando-as rapidamente, enquanto andava. Dez minutos depois, já estava abrindo a porta de casa.

— Tia? – falei sem obter resposta. – Olá, tia! Cheguei!

Falei novamente recebendo o silêncio. A grande casa estava exatamente do jeito que me lembrava. Escura e fria. Passei pela sala e cozinha indo subir as escadas. Com uma certa dificuldade, carreguei as malas até o segundo andar indo até o quarto de minha tia, encontrando-o vazio.

— Não tem ninguém mesmo em casa – afirmo.

Entro em meu quarto e a sensação de melancolia me invade. Assim como o restante da casa, meu quarto estava do jeito que deixei quando fui embora. Os móveis de cor marrom estavam um pouco empoeirados e minha cama estava sem a colcha. Deixei a mala perto do armário e fui até minha janela deslizando as cortinas para o lado. Minha casa ficava sobre uma colina meio alta, da janela eu podia ver todo o condado de Pitikin. A pista de patinação, a casa do senhor Noah, que agora era uma livraria, as grandes montanhas, o terreno de plantações e um pequeno mercado. Mais à frente, ao longe, estava a estrada que dava acesso à cidade.

Um bater de porta chama minha atenção e fecho a janela descendo as escadas a seguir. Tia Emma havia chegado. Seus olhos me encontram, mas não esboça nenhuma reação. Seus cabelos continuavam longos e ela ainda usava um lenço vermelho no pescoço. Nas mãos ela trazia umas sacolas que deixou em cima da mesa. Terminei de descer os degraus, me juntando a ela na cozinha.

— Por que está aqui, Lisa? Deveria ter me ligado avisando que viria – disse sem ânimo.

— Oi, para você também tia e até onde sei, eu moro aqui também – digo indo ajudá-la a tirar algumas verduras das sacolas.

— Faz tempo que você não vem aqui e não existe nenhum motivo para ter vindo agora. O que aconteceu? Resolveu passar as férias aqui?

Lembro-me do meu trabalho, do assédio que sofri do meu chefe, da denúncia que fiz ao presidente da empresa e de ninguém ter acreditado em mim. Resolvi ignorar sua pergunta.

— Como estão as coisas por aqui?

— Tudo igual. – Percebi sua fala um pouco mal-humorada, mas ignorei.

— Vi que o senhor Noah transformou sua casa em uma livraria.

— Sim... O filho mais velho dele é quem toma conta. Noah se mudou para uma casa menor onde mora com a filha.

— Hum – resmungo.

— E então? Quando pretende voltar para capital?

— Acabei de chegar, tia... – digo sentando-me na cadeira. – Por enquanto não pretendo voltar.

Um breve silêncio se instalou na cozinha, enquanto tia Emma terminava de guardar as verduras.

— Está falando sério? – ela questionou e desviei meus olhos. – O que aconteceu? E o seu trabalho?

— Me demiti – respondi sincera e tia Emma fechou a geladeira me fitando.

— Está brincando, não é?

— Não, foi por isso que vim passar um tempo aqui. Talvez volte para capital quando o inverno acabar. Preciso esfriar um pouco minha cabeça, a capital é uma loucura.

— Como pretende ficar tanto tempo aqui sem emprego?

— Vou viver como a senhora... Farei qualquer coisa por aí – informo e ela suspira passando as mãos nos cabelos.

— Eu não faço qualquer coisa por aí, ainda ganho dinheiro com os meus livros antigos, e você, não deveria ter se demitido.

— Fui assediada pelo meu chefe, e ninguém acreditou em mim – digo enraivecida. – Não queria mais ficar no mesmo ambiente que ele. Aquele velho nojento – resmungo.

— Um motivo para não ter se demitido facilmente, deveria ter lutado e procurado por seus direitos.

— Na teoria tudo é fácil, tia.

— Havia esquecido que você sempre tem uma resposta para tudo... Igual sua mãe – resmunga indo subir as escadas. – Já comeu?

— Ainda não...

— Tem uma torta de frango na geladeira, esquente e coma. Depois vá se deitar. A noite será fria hoje.

Ela subiu as escadas e fiquei sentada na cadeira. Minha relação com tia Emma nem sempre foi assim, cheia de farpas e distante. Éramos próximas quando meus pais ainda estavam vivos, mas depois do fatídico acidente de carro, tudo mudou. A palavra, assassina, ficou marcada nela e consequentemente respingou em mim. Ela foi acusada de ter provocado o acidente e na escola eu ouvia coisas como: “Todos da família devem ser assim. Se a tia é, ela também é.” Isso tornou os meus dias na escola terríveis. Achei que após ela ter sido declarada inocente, as coisas iriam melhorar, principalmente entre nós duas, mas não foi bem assim.

Tia Emma se manteve distante. Ela me afastava toda vez que eu me aproximava e sempre mencionava a mamãe, como fez agora. Então, quando concluí o colegial, ela fez questão de me levar para a capital e voltar para a cidade, me deixando sozinha lá. Eu consegui me virar, fiz minha faculdade e me formei em produtora de marketing. Consegui o emprego na empresa Jason’s Decor um mês depois de formada, o que me manteve na capital por mais três anos. Até eu ser promovida e ter outro chefe.

Eu sabia sobre a fama do novo chefe com as mulheres, mas não ligava. A gente só acredita que um dia isso irá acontecer, quando acontece com você. Vinco minha testa quando as imagens do meu chefe me encurralando em sua sala e tentando tirar minha blusa vem em minha mente, me lembrando novamente de que as coisas nem sempre acontecem da maneira que deveriam acontecer. Balanço a cabeça espantando esse pensamento e me levanto da cadeira indo pegar a torta de frango para comer.

***

Já era noite quando resolvi sair do quarto. O tempo havia ficado frio como tia Emma tinha dito, mas eu precisava andar um pouco. Peguei meu casaco, um cachecol que enrolei no pescoço, as luvas e saí. O inverno já havia chegado em Pitikin, e aqui no interior, em épocas assim, as pessoas costumavam ficar mais tempo em casa para se aquecerem do frio, por isso não havia ninguém ali fora. Coloquei minhas mãos dentro do bolso do casaco e andei pela estrada de terra sob a luz dos postes que tinha a cada dez metros. Enquanto andava, deixava que o ar frio entrasse em meus pulmões.

Parei em frente a plantação de trigo, vendo a vasta extensão de terra pronta para o plantio. Levantei a cabeça olhando a lua e fechei meus olhos sentindo a fria brisa bater em meu rosto, porém o barulho de alguém se aproximando me fez abri-los novamente. A pessoa parou alguns metros longe de mim e apesar do capuz em sua cabeça, identifiquei ser um homem. Estávamos debaixo da luz do poste, mas ainda não consegui reconhecer quem era.

— Oi? – falei em interrogação e curiosa.

— Oi! – ele respondeu um pouco ofegante tirando o capuz de sua cabeça. Estreitei meus olhos forçando a memória e sorri ao me recordar da voz. Ele era o garoto que lia em voz alta alguns poemas que nossa professora pedia. Sua dicção era incrível.

— Dylan, não é? – Ele pareceu surpreso, mas devolveu meu sorriso em um cumprimento afirmativo com a cabeça.

— E você é Lisa Adams... – Seu olhar se tornou carinhoso e desviei meus olhos voltando a olhar para a plantação. — Você não deveria estar aqui fora. Está frio. – Ouço-o e sorrio com sua preocupação.

— Só queria andar um pouco.

— Dia difícil?

— Estava difícil, mas agora parece um pouco melhor.

— A capital é sempre uma loucura, não é?

— Com certeza... – suspirei olhando-o.

— Não demore muito, a noite vai esfriar bem mais daqui a pouco.

— Tudo bem – afirmo diante do seu pedido e vejo-o suspirar.

— Bom, eu vou indo. Boa noite.

— Boa noite — digo voltando a olhar para frente. Fiquei apenas mais alguns minutos ali e depois voltei para casa.

Com certeza, não era ruim estar de volta.

***

Levantei-me cedo no dia seguinte. Tia Emma já havia preparado o café com algumas torradas quentes. Comi e logo depois fui até nosso quintal, ver nosso jardim de flores. Eu me espreguicei levantando meus braços e pelo canto do olho vi Dylan subir a pequena colina em direção à nossa casa. Franzi minhas sobrancelhas curiosa indo até à frente da casa.

— Bom dia – falei assim que cheguei.

— Oi... Bom dia. – Cumprimentou meio tímido.

— O que veio fazer aqui?

— Eu vim pegar emprestado alguns patins que sua tia tem.

— Patins?

— Meu pai conversou com sua tia e ela disse que emprestaria alguns que tinha – explicou e olhei para o lado vendo uns cinco pares de patins encostados na parede.

— Claro, estão aqui – aponto, vendo-o vir em minha direção.

Dylan usava as típicas roupas de frio, mas não usava luvas ou gorro. Assim como eu, ele tinha vinte e quatro anos. Lembro-me de ter cruzado com ele na sala de aula, quando éramos adolescentes e das suas leituras semanais. Agora ele havia se tornado um homem muito bonito. Sua voz grossa e, forte, era marcante e seus cabelos pretos continuavam do mesmo jeito, pelo pouco que me lembrava. Acompanhei por segundos, com os olhos, ele andar com o carrinho de mão e subir os dois degraus da casa buscando os patins. Balancei minha cabeça saindo do transe, colocando as luvas que carregava nas mãos para ajudá-lo a levar os patins.

— Obrigado – ele agradeceu e eu apenas sorri, sentindo seus olhos tímidos em mim. – Pretende ficar por quanto tempo aqui?

— Até o inverno acabar – respondi recebendo seu olhar surpreso, enquanto eu colocava o último par de patins no carrinho.

— Daqui a dois meses?

— Provavelmente. – Cresci meus olhos ao perceber um singelo sorriso quase se formando em seus lábios.

— Que bom... Isso é bom. É... Já vou indo. – Ele se despediu rápido e fiquei parada no lugar onde estava, enquanto ele se afastava.

Que estranho. Pensei.

— Ah! Pode me chamar se precisar de alguma coisa – ele falou ao girar o corpo e deitei um pouco minha cabeça.

— Se eu precisar de alguma coisa?

— É... – Sua voz parecia um pouco ofegante. — Trabalho na livraria ali, mas sei fazer um pouco de tudo. Se precisar de um carro para ir à cidade também... Sei que sua tia não tem, então pode pegar o meu, quando quiser... – Balanço a cabeça compreendendo o que ele diz.

— Você poderia me emprestar agora?

— O quê? – indaga um pouco nervoso e sorri.

— O carro.

— Ah! Claro! – Dylan tirou a chave do bolso e jogou em minha direção. Peguei rapidamente e sorri em agradecimento. – O carro está ali na livraria. Tchau.

— Tchau e... Obrigada! – gritei.

Ele praticamente saiu correndo e franzi meu cenho. Será que falei algo de errado? Voltei para casa encontrando minha tia, de frente para o notebook.

— Está escrevendo?

— Você sabe que parei de escrever há um bom tempo.

— Pensei que talvez tivesse voltado...

— Pensou errado. O que quer? – ela me interrompe sem paciência e respiro fundo.

— Peguei o carro de Dylan emprestado para ir até à cidade. Você por acaso quer ir junto?

— Quero... Preciso falar com uma amiga.

— Vou te esperar aqui fora.

Alguns minutos depois já estávamos no carro a caminho da cidade. Vejo o que parece ser um chaveiro em formato de sol e lua, pendurado no retrovisor do carro e lembro-me de Dylan.

— Tia.

— Hum...

— Sabe o rapaz que trabalha na livraria?

— Dylan? O que tem ele? – questiona olhando para fora da janela.

— Eu não me lembro muito bem dele no tempo do colégio, mas parece que ele mudou, não acha?

— Como assim? – pergunta sem me olhar.

— Não sei dizer... – A imagem de seu sorriso tímido vem em minha mente.

— Ele apenas cresceu.

— Eu sei – murmurei. – É só que, ele parece um pouco mais comunicativo do que antes.

— É, pode ser.

— Eu lembro que ele sumia por algumas semanas, às vezes e, depois voltava como se nada tivesse acontecido – digo ao relembrar. – Ele ainda faz isso?

— Não sabia que ele era acostumado a fazer isso no colegial, mas sim, pensando bem agora, não lembro de ver seu rosto pela vizinhança por uns dois anos. Na verdade, ele voltou faz um ano e tomou conta da livraria. Mas apesar de parecer um pouco mais comunicativo, ele continua com a mesma personalidade, sempre reservado.

— Não tenho muitas lembranças dele na escola – reflito.

— Pelo visto ele era como um fantasma na escola, por que você iria se lembrar? – questiona com desdém e suspiro.

— É – murmuro pensativa. — A propósito, tia, por que a senhora ainda usa um lenço vermelho no pescoço?

— Quê?

— O lenço vermelho – aponto. – Por que nunca o tira?

— Isso não é da sua conta.

— É só uma pergunta...

— Não quero falar sobre isso, Lisa – responde um pouco irritada, então me calo.

Eu sabia que seria difícil com tia Emma, só não imaginei que seria tanto. Assim que chegamos à cidade, deixei-a na casa de uma amiga e procurei por um mercado de construção. A casa onde eu iria passar alguns meses, precisava de uns reparos, que minha tia se negava a consertar, então decidi eu mesmo ajeitá-la. Entreguei uma listinha do que eu precisava para o homem que me ofereceu ajuda e em poucos minutos já havia acabado. Liguei para tia Emma perguntando por quanto tempo ela ainda iria ficar e ela disse que eu poderia ir para casa, pois ela iria pegar um táxi.

Voltei para Pitikin, estacionei o carro de Dylan em frente a livraria e antes de sair olhei novamente para o chaveiro pendurado no retrovisor.

— “Com carinho, para Angel” – murmurei. – Deve ser alguém especial.

A frase estava escrita no círculo em formato de sol na cor prata. E a meia-lua na cor bronze que se juntava a ele, parecia familiar para mim. Tentei recordar de onde eu tinha visto aquele pingente, mas nada me veio à memória. Desci do carro, indo até à livraria que estava fechada.

— Procurando alguém? – Uma menina com seus quinze anos perguntou me assustando.

— Oi! Sim – digo me afastando da porta.

— Meu irmão não está aqui agora, ele deve estar na pista de patinação.

— Dylan é o seu irmão? – pergunto curiosa.

— Hunrum... Não é meu irmão de sangue, mas ainda assim é meu irmão – explica com um sorriso no rosto.

— Ah... Vim apenas entregar a chave do carro.

— Pode deixar que eu entrego – diz sorridente.

— Obrigada.

— Você é namorada dele?

— Eu? – indago sem jeito. – Não... Sou apenas uma conhecida, acabei de chegar da capital.

— Dylan não costuma emprestar seu carro a conhecidos.

— Bom... Eu fui colega de sala dele, na escola.

— Ainda assim é estranho – reflete me encarando.

— Quê? – questiono um pouco surpresa.

— Nada não – responde rapidamente com um sorriso.

— É... eu preciso ir. Até.

Pego minhas coisas no carro e entrego-lhe a chave, ainda remoendo o que ela havia dito. Por que ela achou que eu era a namorada dele? Por acaso ele namora alguém escondido? Já em casa começo a consertar a maçaneta do meu quarto, uns degraus da escada que estavam soltos, troquei a torneira da pia que estava vazando e antes que escurecesse, peguei a tinta verde-menta, indo pintar a parede da entrada da casa.

— Nossa... – Escuto a voz de minha tia assim que termino de pintar.

— Gostou? Está ficando bonito, não é?

— Não.

— Verde-menta, não é bonito?

— Nem um pouco.

— Nossa, tia! Esta casa precisa de mais cor – resmungo.

— Essa tinta vai desbotar quando começar a chover.

— A senhora é tão pessimista – digo em reprovação.

— Estou sendo realista.

— Vi na meteorologia que não iria chover hoje.

— Acredita em meteorologia? – ela rebate e sai em direção à porta de casa.

— Sim! As notícias estão dizendo que, por enquanto não irá chover ou nevar e eu acredito! – respondo guardando as tintas e pincéis.

***

Mal havia anoitecido quando a chuva começou a cair. Deitada em meu quarto eu resmungava e me debatia na cama. Inacreditável! Isso só podia ser piada. Desci para a cozinha encontrando minha tia tomando um chá.

— As notícias estão dizendo que por enquanto não irá chover? – tia Emma repete minhas palavras e bufo raivosa voltando para o quarto.

— Não vou cair em suas provocações – digo irritada.

Algumas horas depois sem conseguir dormir, saio do quarto vendo que minha tia já estava deitada. A tevê como de costume estava ligada, aproveitei o barulho para ir lá fora. Peguei o guarda-chuva, calcei meu tênis, que estava próximo à porta, vesti um casaco longo de lã e outro casaco de couro por cima. Meu coração doeu quando vi toda a tinta da parede escorrer pelo chão.

— Quando secar isso vai ficar ridículo... – choramingo.

Um vento forte bateu em meus cabelos trazendo a chuva consigo e dou meia-volta para abrir a porta novamente, mas a maçaneta quebra em minha mão. Abro a boca não acreditando no que via. Isso só pode ser brincadeira. Tentei colocar a maçaneta no lugar e abrir novamente, mas foi em vão. Bati na porta e gritei por tia Emma, no entanto, nada aconteceu. Ela provavelmente estava com tampões no ouvido.

— Que droga! – murmuro chateada.

Olho ao longe a livraria, vendo que as luzes ainda estão acesas. Era ir até lá, ou congelar nesse frio. Rápido, mas com cuidado, corri o mais rápido que pude. Além dos pingos da chuva estarem fortes, o vento era assustador. O guarda-chuva que eu usava, não me protegia de forma alguma da chuva. Ao chegar, bati três vezes e após uma pausa de cinco segundos, bati novamente. Não demorou muito para alguém vir atender.

— Quem é... – Dylan abriu a porta e ao me ver suas sobrancelhas se ergueram. Eu sabia que era loucura alguém estar do lado de fora num temporal.

— Desculpa aparecer assim, mas eu fiquei presa do lado de fora da casa e minha tia já foi dormir, eu...

— Entre – ele diz me interrompendo.

— Obrigada – digo entrando. Deixo os sapatos molhados na antessala da livraria, enquanto ele pega um chinelo me entregando. – Está tão frio lá fora.

— Com certeza está. Um momento... Pode ficar à vontade. – Dylan subiu as escadas para o segundo andar me deixando sozinha.

O ar quente da livraria rapidamente ia me esquentando. O local era bem acolhedor. Havia luzes de fio nas janelas e, em cada estante que continha diversos livros diferentes. De um lado havia um sofá, uma mesinha de centro e um piano pequeno, e do outro lado havia a bancada que Dylan deveria ficar durante o dia. Atrás da bancada havia uma pia e utensílios de café ou chá.

— Aqui... – Dylan chama minha atenção e olho para trás vendo-o me entregar uma toalha, com uma blusa, que julguei ser dele. – O banheiro fica ali nos fundos, se quiser se enxugar um pouco.

— Obrigada. — Sorrio em agradecimento pegando o que ele me oferecia e me dirigindo aos fundos da livraria.

No banheiro, tirei meu casaco de couro juntamente com o casaco de lã, ambos estavam bastante molhados da chuva. Sequei-me rapidamente e vesti a blusa vermelha de mangas curtas que Dylan me deu. Passei a toalha pelos meus cabelos e rosto e, saí. Ao chegar mais perto da bancada, notei que Dylan estava fazendo um chá. Sorri pelo seu jeito preocupado e me sentei no banco. Cuidadoso ele colocou a xícara à minha frente, ao meu lado posicionou um aquecedor portátil e cobriu minhas costas com uma manta.

— Obrigada. – Agradeço novamente.

— Tudo bem... – diz encostando-se na pia. – Está melhor?

— Muito. Você é bem atencioso.

Ele deu uma leve e rápida tossida e mostrou um pequeno sorriso com os lábios desviando seu olhar de mim, observando sua livraria. Dylan parecia um pouco sem jeito, então resolvi puxar algum assunto.

— Não sabia que você vendia livros, ou que este lugar tinha se tornado uma livraria – falo após beber um gole do chá de hortelã.

— Na verdade, o andar de cima ainda é uma casa.

— Você mora aqui? – perguntei e ele afirmou com a cabeça.

— Meu pai decidiu tornar esta parte da casa em uma livraria e atualmente, sou eu que tomo conta de tudo. Como o andar de cima não foi mexido... – Ele cruzou os braços ainda parecendo um pouco inquieto e não pude deixar de notar seus músculos. Desviei meus olhos rapidamente.

— E... Você gosta de trabalhar aqui?

— É claro. É confortável, agradável e as pessoas acham que sou intelectual. – Me peguei sorrindo vendo-o se sentar à minha frente.

— Eu posso... – aponto para as prateleiras e ele logo balança a cabeça em sinal positivo.

— Olhar os livros? Com certeza.

Passeei pelas poucas estantes vendo os livros organizados e enfileirados de acordo com seu gênero. Dylan não era só atencioso e educado, era muito organizado também. Voltei para a estante que havia perto da bancada onde ele estava, cerrando meus olhos.

— Por que têm tantos livros iguais nessa prateleira?

— Está falando do livro O Vento nos Salgueiros? – pergunta e afirmo com a cabeça. – Gosto da história desse livro, então comprei outras edições para saber se a narrativa era a mesma.

— E era?

— Quase... – diz com entusiasmo.

— Hum... E, você também vende livros usados?

— Não.

— Então, por que os livros dessa prateleira têm marcadores?

— Ah... Estou apenas guardando eles. – Olho para ele confusa. — Bom, algumas pessoas vêm aqui só para ler e deixam um marcador quando não conseguem terminar, assim, quando vierem dá próxima vez, saberão onde pararam. Você pode fazer isso, se tiver um livro que queira ler – ele explica enquanto olho para ele impressionada.

— Isso é bem legal. – Ele sorri de forma simples dando atenção a uns livros que havia em cima do balcão.

Devagar volto para meu lugar ficando próxima ao aquecedor portátil. Após alguns minutos em silêncio, volto a falar novamente.

— Por que a livraria se chama Estrella?

— Foi uma espécie de homenagem a minha mãe. Ela adorava livros, então depois da morte dela, eu e meu pai decidimos abrir uma livraria em sua homenagem – Dylan falava enquanto mexia nos livros.

— Eu sinto muito pela perda.

— Foi difícil, mas estamos bem agora. – Ele levantou a cabeça me dando um sorriso tímido.

Tomo mais um gole do chá e pego um dos livros que estavam em cima da bancada. Eu não sabia o que conversar com ele e achava que talvez ele quisesse ficar mais na dele. Então, resolvi ler qualquer livro que estava no balcão. Senti seus olhos brevemente em mim e engoli em seco, contendo a vontade de devolver seu olhar.

Já era tarde quando a chuva cessou e me surpreendi por não ter notado logo de início. Peguei um dos marcadores que havia no cestinho no balcão e marquei a página onde parei.

— Nem percebi que a chuva já parou – digo levantando-me. – Obrigada mais uma vez. — Dylan olhou pela janela vendo que a chuva realmente já havia parado e rapidamente se levantou me pegando de surpresa.

— Espere – pediu. – Aqui, use isto.

Dylan me entregou uma jaqueta que parecia ser dele e voltou a sentar-se atrás do balcão novamente. Surpreendida por sua atitude apenas sorri indo até à porta, pegando minhas roupas que eu havia deixado ali. Antes de sair, olhei para trás observando-o mais uma vez. Ele me fazia querer ficar mais tempo neste lugar. Vi sua cabeça levantar e seus olhos me pegaram observando-o. Puxei uma respiração rápida por ter sido pega e apressei meus passos saindo da livraria.

Que loucura!

Diário sobre Angel — Escrito por Dylan Morris

Ela voltou! Eu estava na pista de patinação ajudando meu pai quando há vi.

“Você viu um fantasma, tio?”, perguntou uma das crianças ao me ver paralisado. Eu disse que não, mas a resposta era sim. Para mim, ela era como um fantasma. Angel, meu primeiro e único amor. Ela não havia mudado nada. Pequena, delicada e linda. Pelo visto o inverno desta vez não será tão frio, querido diário.

***

Desculpe, diário... Larguei tudo o que estava fazendo e fui atrás dela. Angel estava parada em frente o terreno das plantações. Acredite se quiser, ela me reconheceu. E estava tão linda. Será que assim como eu, ela tem insônia? Queria ter ficado com ela e a acompanhado até sua casa, mas você sabe bem o que eu fiz. Será que eu deveria pedir a ela que se juntasse ao nosso clube de livros? Não... A pergunta é, será que eu teria coragem de pedir?

***

Eu fui até à casa dela, diário, mas obviamente não consegui dizer nada. Apenas perguntei por quanto tempo ela ficaria aqui e adivinha só? Até o inverno acabar! Você pode sentir minha felicidade, não é? Fora isso, soube que minha irmã, Alice, acabou descobrindo você. Agora ela não para de me perguntar sobre a Angel. Preciso te esconder muito bem, para que isso não aconteça de novo.

***

Ela estava bem na minha frente hoje. Angel ficou presa do lado de fora de sua casa durante um temporal e veio abrigar-se aqui. Emprestei minha blusa a ela e quando a vi usando, parecia que eu tinha borboletas no estômago. Você é capaz de saber o que aconteceu durante o tempo que ela ficou aqui. Fiquei distante e reservado. Ela tentou conversar comigo, mas eu apenas respondi suas perguntas. Eu queria dizer várias coisas, fazer perguntas também, mas... Argh, por que travo quando estou perto dela?

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