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Eu já estava no segundo copo de uísque. O bar, vazio, prenunciava uma noite chuvosa, como já havia sido anunciado no telejornal da noite. Cada gota que deslizava pelo vidro da janela parecia contar sua própria história. Por um momento, me vi mergulhada em silêncio, revisitando cenas que ecoavam desde o dia em que pisei em Seoul. Essas memórias se misturavam às lágrimas contidas nos olhos, que eu teimosamente evitava deixar rolar.
O proprietário do bar, um homem de meia-idade que me tratava como filha, mantinha um olhar atencioso sobre mim. Desde o dia em que nos conhecemos, quando cheguei da Brasil e acabei do outro lado do mundo, na Coreia do Sul, construímos um vínculo que eu considerava como o de um querido tio. Mesmo de longe, do balcão, eu percebia a aflição estampada em seu rosto, preocupado com os pontos na minha cabeça, resultado do recente incidente. Porém, era a dor no meu coração que mais me turvava a mente.
Uma parte de mim é estrangeira, uma revelação recente que me conecta a um coreano incrivelmente rico. Isso virou minha vida de cabeça para baixo, mas não era esse o motivo por trás dos vinte pontos na minha cabeça e da minha embriaguez. Essa parte da história veio depois.
Ye-Jun aguardou o fechamento do bar antes de se aproximar da minha mesa. Eu estava absorta observando a chuva torrencial, tentando deixar de lado as complexidades da vida. As gotas grossas batiam no vidro, como lágrimas que escorriam livremente pelo meu rosto desgastado pela decepção e pela saudade.
— Min-Ji, você está bebendo demais hoje.
— Querido tio, sempre bebi muito. Desde que cheguei aqui, parece que aprimorei ainda mais esse "dom". Em dias como este, melancólicos e chuvosos, uma dose de destilado se faz necessária. Especialmente após os eventos trágicos que se desdobraram na minha vida, tenho sentido essa ânsia. Não fique chateado comigo. Peço que hoje seja mais que um tio, que seja meu amigo e me ofereça apoio. A empatia entre nós é algo quase surreal. Desde o primeiro olhar, lembra?
— Tudo bem, mas como tio, tenho que perguntar: você está bem? — apontou para o curativo na minha cabeça. —Ver esses pontos na sua cabeça me deixa impotente. Fui descuidado, baixei a guarda, não consegui evitar o pior.
— Tio, por favor, não me faça sentir pior do que já estou. Respondendo à sua pergunta, sim, os pontos vão cicatrizar, não foi nada grave. Uma cicatriz sempre estará ali, lembrando-me daquele dia. Mas o estrago mais profundo está dentro da minha mente e da alma, que sinceramente não sabe qual direção seguir. Fico me questionando por que isso teve que acontecer comigo.
— Não entendi uma palavra estranha que disse, e você não merecia de forma alguma o que aconteceu. A pessoa louca e perturbada que fez isso, que mandou fazer isso com você, é quem merece estar onde está, na prisão. Agora, quem pede um favor sou eu. Vamos parar com a bebida por hoje, estou ficando realmente preocupado. Você consegue me obedecer, por favor?
Ele me olhou confuso e então mudei de assunto:
— Aquele violão elétrico e a aparelhagem musical ainda funcionam? — apontei para o palco inativo naquela noite. Era uma plataforma em formato de meia lua, feita de madeira. A madeira estava desgastada, ao contrário dos fios e instrumentos musicais que pareciam nunca terem sido usados.
— Sim, eles funcionam. Às vezes, alguns amigos os usam e os clientes gostam.
— Nem parece que estão sendo usados. Os instrumentos estão em estado novo.
— Eu sempre troco e doo os antigos para escolas de música.
— Que incrível. Posso usá-los?
— Sim, claro. Este bar é todo seu.
Levantei-me, dirigi-me ao violão. Ajustei a banqueta, liguei o sistema de som e senti a vibração das cordas, acomodando-me em frente ao microfone. O violão estava afinado. Parecia que os instrumentos não ficavam ociosos por muito tempo.
— O que você pretende fazer? — titio perguntou, uma sobrancelha arqueada.
— Cantar uma bela canção brasileira. Por favor, grave tudo.
— Desde quando você canta?
— Há tantas coisas que não sabem sobre mim. Preciso aproveitar ao menos esse dom que ainda consigo lembrar que possuo. Herdei da minha mãe, ela cantava como um rouxinol. É um canto que transmite pureza e beleza. Dona Marta era assim, sua voz melodiosa encantava qualquer melodia.
Sentada, permiti que a nostalgia do momento tomasse conta do ambiente. Enquanto cantava "Outra Vez", de Roberto Carlos, as lágrimas não puderam ser contidas.
"Você foi o maior dos meus casos. De todos os abraços, o que eu nunca esqueci. Você foi dos amores que eu tive, o mais complicado e o mais simples pra mim. Você foi o melhor dos meus erros. A mais estranha história que alguém já escreveu. E é por essas e outras que a minha saudade faz lembrar de tudo outra vez...
Você foi a mentira sincera. Brincadeira mais séria que me aconteceu. Você foi o caso mais antigo. O amor mais amigo que me apareceu. Das lembranças que eu trago na vida, você é a saudade que eu gosto de ter. só assim sinto você bem perto de mim Outra Vez.
Esqueci de tentar de esquecer. Resolvi te querer por querer. Decidi te lembrar quantas vezes, eu tenha vontade sem nada a perder.
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