De volta ao lago

- Cuidado!

Carolina foi tirada de seus pensamentos com o grito e só então notou a bicicleta vindo em alta velocidade na sua direção, felizmente o ciclista conseguiu desviar a tempo, o que não impediu de a fazer cair para trás com o susto.

Carolina que costumava ser muito atenta, nessa manhã estava relativamente mais distraída, todos os anos era assim nessa data, o aniversário da morte de sua melhor amiga, fazia seis anos que Priscilla havia partido, mas a dor da ausência parecia não ter diminuído nada após todos esses anos.

Rapidamente ela se levantou e passou a mão pela roupa certificando-se de não haver nenhum resquício de sujeira e lutou para afastar os pensamentos enquanto caminhava até chegar ao escritório, ela precisava estar impecável nesse dia, pela primeira vez ela seria a representante da empresa em uma reunião com um importante cliente e essa seria a chance de mostrar seu valor. Carolina era estagiária na maior empresa de advocacia do país, nunca foi com o que ela sonhou, mas se dedicar e focar na carreira era um jeito de ignorar o passado.

- Bom dia, Dra. Fabiana.

- Bom dia Carolina, esta pronta para a reunião?

A voz na cabeça de Carolina ecoava um NÃO!

- Claro!

A reunião seguiu sem grandes problemas, Carolina estava tendo um ótimo desempenho, mas em certo momento enquanto explicava e corria os olhos atentamente entre os clientes fixou o olhar no colar de uma das sócias, e por alguns longos segundos Carolina ficou simplesmente ali, imóvel, como se todos os sentimentos que guardou por todo esse tempo estivessem estourando por um simples pingente, um pingente de trevo. Dra. Fabiana percebendo o desconforto interveio e finalizou a apresentação enquanto Carolina se recompunha.

De volta para sua mesa ainda sem falar nenhuma palavra Carolina era tomada por Flashs do passado, o pingente de trevo a transportou diretamente para seu aniversário de 10 anos:

- Lina te trouxe um presente, fecha os olhos!

Ela parecia ouvir a voz da velha amiga nitidamente, mas lembrar de seu rosto estava cada vez mais difícil.

- Um colar! É um trevo?

- Sim, um trevo de quatro folhas pra representar a sorte que a gente tem por sermos melhores amigas. Olha eu também tenho um! - Priscila disse enquanto mostrava o seu já no pescoço.

Faziam 6 anos que Carolina não usava mais seu colar, ela dizia que a sorte acabou no dia em que sua melhor amiga se foi, o colar estava guardado junto com todas as coisas que a faziam lembrar de Priscila na antiga casa que também foi abandonada quando o terrível acidente ocorreu. Aquelas lembranças já não faziam mais parte da vida dela, ela fez questão de deixar tudo no passado, tudo o que lhe causava dor, mas mesmo não sendo de muita fé Carolina não conseguia deixar de pensar que aquele trevo, naquele dia tão significativo era de certa forma um sinal.

Seus pensamentos foram interrompidos por Fabiana que estalava seus dedos na frente de seu rosto como se tentasse a tirar de um transe.

- Ei Carolina, você tá me ouvindo?

- Perdão Dra. o que disse?

- Disse para você não se preocupar, sua apresentação foi excelente, todo mundo fica travado na primeira vez, não deixe que isso te abale e gostaria de te parabenizar, você será promovida!

Carolina naquele momento foi tomada por uma força que a muito tempo não sentia.

- NÃO!

Ela disse em alto e bom tom pegando a Dra. e os colegas de trabalho que estavam mais próximos totalmente de surpresa.

- como assim NÃO?

- me desculpe Dra. Fabiana, mas eu me demito.

Carolina pegou suas coisas e saiu da empresa tão depressa que todos permaneceram boquiabertos e sem reação. Ela ainda não sabia o que iria fazer, nem para onde iria ir, mas aquele trevo sendo ou não um sinal a fez perceber que não dava mais pra fugir.