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capítulo um
É cansativo não poder confiar em ninguém.
É cansativo tratar cada aliado político como um inimigo em
potencial, porque lealdade é um conceito há muito esquecido e a palavra
de alguém não vale mais nada. Acordos assinados não valem mais nada,
muito menos a suposta honra de um governante.
Meus irmãos sempre me chamaram de paranoico quanto a isso. A
atividade preferida de Stephen é pegar no meu pé com meu excesso de
zelo e desconfiança constantes. Richard, o mais velho e rei de Delway,
entende minha preocupação, já que, de nós três, é o que mais lida com
politicagem, mas até mesmo ele teve certeza de que eu estava
exagerando algumas vezes.
Adivinha só? Eu não estava.
Os filhos da puta que apareceram quando estávamos mais
vulneráveis, jurando aliança e apoio, agora estão prontos para fazer
demandas. É claro que estão. Nada vem de graça quando o assunto é
poder.
— De novo! — grito, mãos atrás das costas, olhos ferozes e
atentos sobre os soldados que repetem a sequência de golpes na aula
de artes marciais.
Ninguém se atreve a reclamar de cansaço, mesmo que eu saiba
que estou exigindo muito mais deles hoje do que o normal. É o que
acontece quando estou puto. Não demoro a perceber que apenas assistir
ao treinamento não vai ajudar a acalmar minha agitação. Mantenho os
olhos atentos sobre eles enquanto enrosco ataduras nos nós dos dedos,
sabendo que estão nervosos com a minha presença nem tão rotineira
assim.
Nervosismo esse que aumenta quando percebem que estou
entrando no tatame também.
— Não precisam parar — aviso, transitando entre as pessoas que
depositam aqui cada gota de energia que têm para oferecer.
Conserto algumas posturas, corrijo golpes feitos errados, dou mais
meia dúzia de instruções. Quando a minha proximidade deixa de ser um
problema e todo mundo está concentrado de novo no que deve fazer,
começo a treinar também. Não demora para alguns soldados se
animarem com a perspectiva rara de treinar comigo, e é um ótimo
lembrete de que é aqui que me sinto em casa.
Muito do meu trabalho é burocrático agora, cuido de estratégias
militares, coordeno equipes. Gosto da possibilidade de manter olhos
atentos sobre a minha família e garantir que estão bem, mas sinto falta
de estar aqui com mais frequência. Suado, com a pele quente, a
ansiedade e preocupações diminuindo conforme meus batimentos
cardíacos aumentam.
Desvio de alguns socos, esquivo de chutes precisos, mas,
eventualmente, um me acerta. A dor irradia pela minha mandíbula onde
Brian me acertou, e estou sorrindo quando volto a olhar para ele. Meu
segundo em comando sorri também, uma expressão provocativa no rosto
ao indicar com as mãos para que eu pare de enrolar.
A luta se torna entretenimento para os outros soldados, que deixam
seus próprios treinamentos de lado e passam a nos assistir com
entusiasmo. Brian desvia da maior parte dos golpes que desfiro, quase
me acerta alguns outros, mas, no fim, no resultado é o previsto e ele
termina com as costas no tatame, o peito subindo e descendo em uma
respiração ofegante depois que o derrubo com um gemido doloroso.
— Estão liberados — instruo para os demais enquanto estico a
mão para ajudar Brian a se levantar.
Ele aperta meu ombro e solta uma risada baixa quando está de pé.
— Eles vão falar disso a semana toda, você sabe — diz divertido,
afastando-se de mim em busca de água.
Arranco a camiseta suada pela cabeça e livro-me das ataduras das
mãos.
— Da próxima vez, não cai com tanta facilidade e isso não vai ser
um problema.
Brian me mostra o dedo do meio, balançando a cabeça. Sem se
virar para mim, mexendo em alguma coisa dentro da sua mochila, ele
pergunta:
— Você vai me dizer qual o problema agora?
Encaro suas costas, considerando o que dizer. Sua postura é firme,
rígida como a minha. A pele escura está coberta de suor, os ombros
estão tensos. Brian trabalha comigo há tempo o suficiente para saber que
alguma coisa não está certa. Não consigo explicar uma situação que
ainda não compreendo. Estou em um campo minado, tomando cuidado
com meus passos.
— Ainda não sei — ofereço por fim. — Richard e eu vamos nos
encontrar com o rei de Devondale em algumas horas.
Isso chama a sua atenção. Brian me olha por cima do ombro,
erguendo uma sobrancelha.
— O rei em pessoa? — pergunta devagar. Limito-me a erguer as
sobrancelhas em uma concordância contrariada. — O que esse filho da
puta quer?
Rio pelo nariz, jogando os olhos ao teto.
— É exatamente isso que quero descobrir.
Brian estreita os olhos e não precisa dizer nada. Estamos na
mesma página quanto a Elijah Denver: ele não confia no homem, eu
confio menos ainda.
Meus irmãos fizeram um ótimo trabalho em transgredir todas as
regras e tradições nos últimos anos. Stephen cumpriu o acordo político
feito por nossos pais e se casou com Louise, é verdade, mas nos colocou
em uma situação delicada com suas transgressões depois disso. E
Richard… O maior defensor das tradições seculares da nossa família
chocou a todos nós quando recusou o seu próprio casamento político e
fez de uma plebeia a rainha de Delway. Heather arrebatou seu coração
de tal forma que o rígido rei foi contra tudo o que acreditava até então,
por ela.
Louise e Heather trouxeram luz para a vida dos meus irmãos, e eu
mataria pela felicidade deles. Do mesmo jeito que eu faria qualquer coisa
para proteger minhas cunhadas e sobrinhos. Mas não vou negar que
ambos os casamentos trouxeram tensão política para o país. Stephen
ultrapassou alguns limites que os mais conservadores acharam
inaceitáveis, e Richard cementou o rebuliço ao trazer Heather para o
trono.
Foi quando sua competência como regente começou a ser
questionada. Muitos antigos aliados questionaram como poderiam confiar
em um governante que não seguia as regras do próprio país. O mais frio
e prático dos homens foi chamado de fraco e passional em mídia
internacional. E um governante fraco representa um país fraco. Um país
fraco se torna vulnerável.
É o meu trabalho impedir que isso aconteça.
Não demorou para que outros líderes mundiais emitissem suas
opiniões sobre o assunto — a favor ou contra, todos tiveram algo a dizer.
A balança pendeu para o nosso lado, no fim, quando a maioria dos
nossos parceiros comerciais decidiu que não podiam se importar menos
com o relacionamento de Richard desde que pudessem continuar tendo
todas as vantagens que alianças conosco proporcionam.
É aí que Elijah Denver entra.
O rei de Devondale nunca foi minha pessoa preferida, mas Richard
não quis quebrar mais essa tradição. São poucas as monarquias
restantes, e meu irmão segue à risca o código moral de apoio mútuo.
Então, aceitou a aliança oferecida. Aceitou o anúncio público de apoio
militar, de vantagens comerciais; aceitou os aliados que vieram a tiracolo.
E agora Denver quer alguma coisa em retorno.
O que, eu ainda não sei. Mas vou descobrir em breve.
Richard está nervoso. Meu irmão tenta disfarçar, mas as rugas que
se formam em sua testa não abrem espaço para dúvida. De pé ao seu
lado com os braços cruzados, assisto enquanto tamborila os dedos na
mesa, confere a hora no relógio de pulso, se remexe na cadeira. Elijah
está atrasado, e duvido que seja acidental.
Quando o homem finalmente chega, acompanhado dos seus
próprios guardas, tem um sorriso grande no rosto, como se estivesse se
encontrando com um grande amigo.
— Richard! — diz, abrindo os braços para um abraço que não vai
receber. Não acho que estivesse esperando um, de qualquer forma,
porque logo se senta na cadeira no lado oposto à mesa, cruzando os
dedos sobre o colo. — Theodore — estende o cumprimento a mim com
um aceno de cabeça.
Percorro o olhar pelo seu rosto, tentando desvendar o que ele quer
na expressão despreocupada. As rugas da idade começam a aparecer
pela pele escura, os olhos experientes podem até estar recobertos de
tranquilidade, mas não escondem o brilho malicioso.
— Fez boa viagem? — Richard pergunta assim que o homem
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