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Por Ryan Hernandes.
Seis meses.
Esse é tempo que o doutor que acompanha Helena diz que minha mãe tem de vida. Tento encontrar forças para me levantar da cama depois de largar o telefone no colchão. Não consigo aceitar o que o doutor acabou de me confirmar em uma mísera ligação que não levou nem dez minutos.
Sinto falta de ar só em pensar em ficar sem minha mãe, o doutor me disse que não há muito mais o que fazer, utilizamos todos os recursos, químio e radioterapia, cirurgia e tratamentos alternativos e experimentais. Nada adiantou, a maldita doença sempre volta no mesmo lugar.
Me sento na beira do colchão e me pergunto por que ela. Helena é a mulher mais incrível que já conheci na vida, nunca foi menos carinhosa comigo por conta do caos que meu pai trazia para casa junto com seu maldito vício em álcool. Após gritos, discussões, barulhos de coisas se quebrando e voando pela casa ela ia até o meu quarto me desejar boa noite como se nada tivesse acontecido, sua voz doce me garantia que tudo ficaria bem mesmo que eu pudesse ver seus machucados e hematomas marcando a pele.
Minha mãe foi uma das únicas pessoas que me compreenderam quando fui incapaz de lamentar a morte do meu pai quando eu tinha apenas 17 anos, ele sempre foi o causador do nosso sofrimento, eu achava que nosso sofrimento seria enterrado com ele. Foi assim, pelo menos por um tempo.
Helena foi a primeira a acreditar em mim e apoiar meu tio quando ele teve a ideia de me colocar a frente da construtora aos 18 anos, sob supervisão dele é claro, mas ainda assim era uma loucura colocar alguém tão jovem na liderança de uma empresa grande que levou gerações para se estabelecer.
Aos olhos de todos eu era incapaz, mas não para ela, Helena sempre me enxergou além do que todos pareciam ver. A consequência disso foi meu esforço para não decepcioná-la, aprendi tudo que foi necessário, me qualifiquei, estudei... Os primeiros anos foram cansativos mas minha recompensa estava estampada no rosto de cada pessoa.
Respeito e admiração.
Minha gestão calou a boca de quem me criticou no início, fazendo-os se dobrarem para mim. Nunca fui de muitas palavras, mas passei a ser de muitos resultados.
Hoje, formado, bem sucedido e estabelecido no mercado, vejo que só cheguei aqui por causa de Helena, faria qualquer coisa por ela. Estar presente é o mínimo, o óbvio, e o que já faço desde que descobrimos o câncer há exatos dois anos, se isso é tudo que posso fazer então continuarei aqui supervisionando os remédios, segurando sua mão durante as crises de dores onde o remédio demora uma eternidade para fazer efeito, e perdendo noites de sono junto a ela.
Mesmo que me rasgasse por dentro vê-la perder o brilho da vida aos poucos, é meu dever, pois nós só temos um ao outro e isso jamais mudaria.
Decido que não vou dizer a ela o que o médico me informou, vamos aproveitar da melhor maneira nossos momentos juntos. Vou planejar tudo, trabalhar menos, levá-la em lugares onde ela gosta de ir, dar a ela as besteiras que ama comer e que estavam suspensas. Vou fazê-la feliz.
— Bom dia. — Cumprimento as duas que tomam café, a mesa está cheia como sempre mas o prato de minha mãe me parece vazio.
— Bom dia. — Respondem em uníssono, Jamily está sentada a mesa, ela é filha da senhora Duarte, que trabalhou aqui em casa durante anos, mas graças a um problema de saúde não pôde mais exercer a profissão, então a contratei em seu lugar.
Me inclino para receber um beijo da minha mãe, estou atrasado mas que se dane, eu sou o presidente. Me sento para tomar café com ela, as duas conversam assuntos superficiais durante o café, não deixo de analisá-la. Perdeu peso, seus lábios não tem mais a cor vibrante de anos atrás, estão pálidos e as unhas estão rachadas bem no meio.
Seus cabelos antes longos agora estão curtos, só cresceram após o término das sessões de quimioterapia e estão bagunçados, ela não se arruma visto que os momentos em que está sem dor e acordada são raros agora.
Helena toma remédios fortes para as dores e os mesmos a fazem ficar apagada por longos períodos. As vezes vem comer na mesa, olha a vista da varanda e assiste as novelas.
— Está sentindo alguma coisa? — Pergunto apenas por hábito, para ter certeza. Ela me olha e acena negativamente.
— Vou trabalhar só até o meio dia hoje. Vamos tomar café da tarde juntos. — Anuncio e ela sorri.
— Tudo bem, vai trazer alguém especial? — Arqueio uma sobrancelha, Helena não esconde o quanto quer me ver amarrado, ou melhor, casado.
— Não mamãe, ninguém especial. Só nós dois. — Ela nega com a cabeça em sinal de decepção. — E... Recebi a notícia de que sua dieta vai se normalizar aos poucos, então Jamily pode preparar os bolos de sua preferência hoje.
— Ah, graças a Deus. — Ela toma um pouco de seu suco, Jamily e eu rimos da forma engraçada que ela fala — Por que vai chegar cedo, filho?
— Menos trabalho, contratei uma secretária e ter Bernardo por perto me desafoga um pouco mais. — Tento parecer casual enquanto mordo uma torrada.
— Hm. — Murmura ela. — Não acho que ver as novelas da tarde vá te animar muito. — Ela gesticula com as mãos, eu sorrio e nego. E então pego uma de suas mãos para beijar.
— Na verdade o que me anima mesmo é a companhia. — Ela faz um bico como se minha frase fosse digna de um troféu. Escuto uma risada discreta de Jamily.
— Está vendo só Jamily? Esse menino é um conquistador barato, sempre soube que ele seria assim — Ela brinca e as duas riem, finjo estar ofendido.
— Não use comentários mentirosos para disfarçar o quanto a senhora ama esse conquistador barato.
— Amo mesmo. — Ela dá de ombros. — Filho, olha a hora, vai se atrasar.
— Já estou atrasado. — Termino de comer e beber o suco, olho rapidamente o relógio de pulso, atrasado é um eufemismo.
Me despeço das duas, dou um cumprimento para Jamily e um beijo na testa da minha mãe, deixo o apartamento e vou de carro em direção à construtora. A empresa foi a única coisa boa que meu pai deixou, e mesmo assim ela esteve a um passo da falência por diversas vezes graças ao maldito vício dele, só não fechou as portas graças ao meu tio Paulo, irmão dele. Meu tio também foi meu supervisor quando assumi, me ensinou muito do que sei hoje.
Vou para o último dos seis andares do prédio onde fica a minha sala, fiz questão de que tivesse uma boa vista, olhar a paisagem me acalma quando estou a ponto de explodir. Nem tenho tempo de me acomodar na cadeira direito, já ouço duas batidas na porta e peço para que entre, seja lá quem for.
— Bom dia, senhor Hernandes.
— Bom dia. – Respondo a contra gosto. Admito que contratar uma secretária foi a melhor coisa que fiz, não que eu quisesse mas foi necessário, principalmente agora que vou dar um jeito de diminuir o ritmo, estou disposto a jogar tudo para o alto se for preciso, ninguém é mais importante que minha mãe.
— O senhor Siqueira está aqui há trinta minutos. — Trinta minutos? Bernando odeia esperar.
— Deixe-o entrar. — Ela concorda em um aceno.
— Devo trazer algo para os dois? — Levanto o olhar.
— Por enquanto não. Obrigado. — Lívia deixa a sala, usa roupas formais e os cabelos loiros presos em um rabo de cavalo, é bonita não dá para negar, seu perfume é bom e permanece na sala depois que ela sai.
Penso em quanto tempo faz que não me interesso por ninguém, com todo esse turbilhão em casa mal sobra ânimo e tempo para essas coisas.
— Devia saber o significado de "ser pontual". – Levanto o olhar, Bernardo está possesso, seu rosto está vermelho de raiva. Ele puxa uma das duas cadeiras em frente a minha mesa de forma impaciente e se senta.
— Perdão. — Ajeito a postura. Ele nega, ainda irritado.
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