Distantes um do outro, Fernando toca seu piano para multidões agora. Diferente de anos atrás, onde tocava apenas em barzinhos ou restaurantes onde ninguém dava muita atenção. Apesar de ter subido na vida ele ainda sentia um gosto amargo na boca: a perda de um grande amor. Luíza ainda sente seu coração doer cada vez que lembra de seu namorado da faculdade. Que alegrava os seus dias, mas não era bem visto por seus país. Ela acabou abaixando a cabeça e se deixou levar. Anos depois, ela decide arriscar. É uma noite importante para os dois. Uma apresentação intimista para críticos aclamados, mas com um participante especial: Luíza. E entre melodias e arranjos, notas e sons, os segredos de liquidificador começam a voltar, junto com eles, sentimentos adormecidos prontos para tomarem conta dos corações novamente.
Fernando arrumava o terno impecavelmente alinhado no corpo, feito sob medida para aquela ocasião. Alisou a lapela, checou as abotoaduras, passou a mão nos cabelos pretos mais uma vez, e então suspirou pesado.
Nao estava completamente nervoso, hoje seria uma apresentação mais intimista, algo pequeno, cerca de 50 pessoas.
Mas todos críticos para ouvirem seu novo trabalho. E seu estômago embrulhada ao pensar o quanto aquele novo álbum tinha sido completamente pessoal.
Pessoal o bastante para entrar em suas feridas mais profundas, e tirar notas amargas de seu peito cada vez que cantava as melodias que escreveu nas noites insones que passou com lápis, papel e piano. Despejou tudo que estava entalado a anos, toda dor reprimida, e todo amor que ainda teimava em queimar em seu peito.
Ele suspirou novamente se olhando no espelho. Colocou a mão no peito, onde a correntinha com um pingente em forma de clave de sol estava pendurada em seu pescoço: presente de seu antigo amor. E por mais que quisesse e tentasse de todas as formas seguir em frente, aquele colar nunca saía de seu pescoço. Prova de que tudo tinha sido real. Prova de que fora amado e que amou, e lutou até seu último resquício de força.
Mas o destino não quis que ficasse juntos. E era isso. Tinha que aceitar.
- 2 minutos - o staff disse para Fernando, que saiu do camarim em direção ao pequeno palco em meio ao bar.
- Estão todos aí? - Ele sussurrou alongando os dedos.
- Estão sim Nando - seu agente disse apertando seus ombros - Vai dar tudo certo.
Ele respirou fundo e entrou no salao, um foco de luz o alcançou, fazendo com que não enxergasse as pessoas a sua frente. Palmas foram dadas para o receber então ele logo sentou no piano.
- Agradeço a todos que puderam vir essa noite - Ele disse no microfone a sua frente - Espero que gostem das minhas novas músicas, são as mais pessoas que escrevi até agora, muitos sentimentos guardados vieram a tona, é um trabalho muito íntimo pra mim.
E então seus dedos começaram a trabalhar, tocando as teclas pretas e brancas, arrancando suspiros da plateia, que o observava de boca aberta, fazendo anotações aqui e ali.
Fernando estava em sua máxima potência aquela noite, entregando tudo de si.
- Está é a última música - Ele disse - É a mais intensa pra mim. Fiz pra uma pessoa que amei muito, não sei como ela está agora, mas espero que esteja feliz onde quer que esteja.
"Pra que mentir
Fingir que perdoou
Tentar ficar amigos sem rancor
A emoção acabou
Que coincidência é o amor
A nossa música nunca mais tocou
Pra que usar de tanta educação
Pra destilar terceiras intenções
Desperdiçando o meu mel
Devagarzinho, flor em flor
Entre os meus inimigos, Beija-flor
Eu protegi o teu nome por amor
Em um codinome, Beija-flor
Não responda nunca, meu amor, nunca
Pra qualquer um na rua, Beija-flor
Que só eu que podia
Dentro da tua orelha fria
Dizer segredos de liquidificador
Você sonhava acordada
Um jeito de não sentir dor
Prendia o choro e aguava o bom do amor
Prendia o choro e aguava o bom do amor"
A plateia ovacionava em pé, aplaudindo e gritando, Fernando se levantou do piano, fazendo curtas reverências, então a luzes foram acessas e as pessoas se aproximaram para o elogiar e cumprimentar.
Tinha sido um total sucesso, diziam. Com certeza seu novo álbum venderia milhões de cópias.
Mas ele só desejava que uma pessoa ouvisse. Ele desejava tanto que por um momento até achou que tinha visto um par de coxas muito parecidas das que invadiam seus pensamentos. Ele levantou os olhos para a mulher de costas indo em direção a saída.
Ele continuou olhando quando a mulher parou na porta, os cabelos loiros como ele se lembrava, virando levemente o rosto para trás, encontrando seus olhos.
Era ela. Seu corpo todo paralisou e ele nem escutava mais o que o senhor ao seu lado o dizia.
Luiza tinha vindo.
Luiza Moraes tinha escutado suas músicas.
Luiza Moraes agora sabia que ele ainda a amava.
~ 🎶 ~
Codinome Beija-flor - Cazuza
Capítulo 1 Pra que mentir, fingir que perdoou
21/08/2021
Capítulo 2 Tentar ficar amigos sem rancor
21/08/2021
Capítulo 3 A emoção acabou, que coincidencia é
21/08/2021
Capítulo 4 A nossa música nunca mais tocou
21/08/2021
Capítulo 5 Pra que usar de tanta educação
21/08/2021
Capítulo 6 Pra destilar terceiras intenções
21/08/2021
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